16 outubro, 2016

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (LIII)

EXTRA! EXTRA! FERNANDA GENTIL SAI DE NÁRNIA!
Putz, só agora é que você vai falar sobre isso?
Pois é, desculpem-me o atraso. Mas é que eu estive bem ocupado dando um esporro em alguns cretinos – inclusive os que fizeram teorias da conspiração em torno da morte trágica de Domingos Montagner – e dando aula de história colonial a um aluno relapso desta matéria, chamado Deltan Dallagnol.
Mas antes de ir para o assunto em pauta, fica uma pergunta: o que cargas d'água a vida pessoal das celebridades interessa ao grande público?
Bem, acredito que há duas razões para isso. A primeira é bem simples, e tem a ver com o respeitável público – isso mesmo: eu, você, as torcidas do Flamengo, Corinthians etc., etc.: em se tratando da vida dos famosos e celebridades, todos nós, que temos uma vidinha em comum, sempre ficamos interessados em saber se a vida dos famosos e celebridades é mais ou menos igual à nossa – contas a pagar, fraldas dos filhotes para trocar etc. – ou se é um pouquinho diferente.
E sim, isso vale também para os participantes dos Big Brothers da vida – tanto os que, a partir de sua participação neste "programa" dão um rumo às suas vidas (a apresentadora Sabrina Sato, a atriz Grazi Massafera e o deputado Jean Wyllys) quanto os mala-sem-alça-e-sem-rodinha-cheias-de-pedra-no-meio-da-chuva que só vivem da imagem e da fama efêmera de terem sido BBBs e não são mais porra nenhuma.
(Se quiser falar "dããã" porque eu estou lhe falando o óbvio ululante, fique a vontade: "dããã". Mas você realmente parou para pensar isso?)
E a partir desse interesse, surge uma relação de identificação entre público e celebridade – o primeiro, de certa forma, quer se espelhar no que aquela celebridade é, diz ou faz. (O que já é aproveitado pelo capitalismo faz tempo, através de patrocínios e contratos de exclusividade de empresas e seus produtos.)
A segunda razão também é bem simples: sem tais notícias sobre as celebridades, a grande velha mídia (é, aquela que o Paulo Henrique Amorim apelidou de PIG - Partido da Imprensa Golpista) perde uma boa parte de seu faturamento, CQD este artigo de Tcharly Magalhães Briglia – com citações de gente muito fina – para o Observatório da Imprensa:

O interesse do público pelo universo das celebridades tem sido responsável, há muito tempo, pelo sucesso de muitas publicações. Revistas sobre famosos, sites de notícias e programas de TV e de rádio especializados em falar sobre os artistas já fazem parte da realidade comunicacional brasileira e conseguem cativar um público fiel. Segundo a Pesquisa Brasileira de Mídias (2014), entre as seis revistas mais lidas e lembradas pelo público, três são desse universo da fama: Caras, Contigo! e Tititi, o que comprova o gosto pela temática.
O imaginário nacional, notadamente influenciado pela televisão, justifica um pouco do impacto da mídia sobre TV. Como destaca Arbex (2001):

“A identidade do telespectador com as personagens da telenovela ocorre por um processo de “enquadramento” da vida num certo enredo permitido e tolerado. O processo de identificação permite viver certas emoções sem correr riscos, no isolamento de sua casa e cercado de todas as garantias (nada mais conhecido do que o enredo de uma telenovela)” (ARBEX, 2001, p. 47).

Quando os dois interesses – o do PIG e o do respeitável público – se encontram, se estabelece uma retroalimentação em torno de uma construção social devidamente afiançada por esta grande mídia – como disse outro autor citado neste mesmo artigo, Felipe Pena, em seu livro Teorias do Jornalismo (São Paulo, Contexto, 2013 3ª edição):

"Revistas de fofocas, periódicos sobre famosos e programas de TV como Vídeo Show e TV Fama vivem da encenação e repercutem infinitamente em novas encenações. A mídia produz celebridades para poder realimentar-se delas a cada instante em um movimento cíclico e ininterrupto. Até os telejornais são pautados pelo biográfico e acabam competindo com os filmes, novelas e outras formas de entretenimento. É uma Disneylândia de notícias, como se os redatores fossem Mickey Mouse e Pateta" (PENA, 2013, p. 88, grifo do autor).

Isso em se tratando somente da vida pessoal da celebridade.
Quando vamos para a sexualidade desta celebridade (ih, rimou!), a coisa já muda de figura. Especialmente quando uma celebridade qualquer sai de Nárnia... isto é, do armário.
Breve explicação para quem ainda não está no século XXI e ainda não sabe (sim, existem pessoas assim! Isto é incrível!) o que é "armário", com oauxílio luxuoso da Wikipedia:

"No armário" é uma expressão que geralmente refere-se a comportamento sexual, orientação sexual ou identidade de gênero reservados. O mais comum é dizer respeito a pessoas lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT) (...) Alguém que sai do armário é considerada "out" ou "aberta". Por exemplo, alguém que é "abertamente gay" evita parecer que é heterossexual.

Agora, o que é "sair do armário", com a Wikipedia de novo:

Sair do armário é uma expressão que descreve o anúncio público da orientação sexual ou identidade de género de alguém, ou de si próprio. Estar fora do armário significa que alguém, cuja orientação é geralmente, lésbica, homossexual, transgénero ou queer, não oculta a sua orientação sexual.
A "saída do armário" é geralmente um ato voluntário, em que o próprio decide revelar à família, amigos, colegas ou quaisquer outros, a sua orientação sexual. Por vezes a revelação deste tipo de informação pessoal é feita sem o consentimento do sujeito envolvido, o que acontece por motivos de ordem política, de denúncia de figuras públicas ou simplesmente por ambição de publicidade do delator.
Enquadrada e debatida como uma questão de privacidade, sair do armário é descrito muitas vezes como um processo psicológico; uma tomada de decisão ou a assunção de riscos; uma estratégia ou plano; uma massa ou evento público; um ato de fala e uma questão de identidade pessoal; um rito de passagem; libertação ou emancipação da opressão; uma provação e, por fim, um meio para sentir o orgulho LGBT, ao invés da vergonha e estigma social (ou até mesmo o suicídio). O Autor Steven Seidman escreve que a expressão refere-se "ao poder do armário para dar forma ao núcleo da vida de um indivíduo, que fez da homossexualidade um drama pessoal, social e político significativo na América do século XX."
A professora e filósofa norte-americana Judith Butler argumenta que o processo de "sair" faz as pessoas que são LGBT verem-se livres da opressão. Butler afirma que, embora estas pessoas podem se sentir mais livres para agir como si mesmos, "a opacidade envolvida em entrar em um território não-heterossexual insinua julgamento sobre a sua identidade", conforme escrito no livro Imitação e Insubordinação de Gênero (1991).

Pode-se até brincar com isso – como neste vídeo do Canal das Bee ) – mas nem tanto.
(Ei, e quanto à Nárnia? O que é que as Crônicas de Narnia, escritas por C.S.Lewis entre 1949 e 1954, e os filmes que resultaram delastem a ver com esse peixe? Vou lhe responder com outra pergunta: por onde Peter, Susan, Edmond e Lucia Pevensie chegam ao mundo de Nárnia? Isso mesmo: entrando em um antigo e misterioso guarda-roupa. Daí, as novas gírias LGBT: "entrar em Nárnia" ou "sair de Nárnia". Ou seja, entrar e ficar no armário... e num mundo fantasioso em que o gay ou lésbica enrustido – que, aliás, é chamado/a de "narniano/a" – se acha hetero... – ou sair do armário – se assumir de uma vez para o mundo.)

Eu disse que a explicação é "para quem ainda não está no século XXI e ainda não sabe"? Ato falho. Na verdade, acho que nem o século XXI sabe que está no século XXI.
Porque esse século, esse mundo, nunca foi e ainda não é perfeito.
Num mundo perfeito, uma celebridade sair de Nárnia não seria notícia. Ou, já que o público sempre quer saber da vida pessoal dos famosos, a notícia seria assim: "Fulano/a de Tal assume relacionamento", ou "Fulano/a de Tal está namorando". Ponto.
Ou, no mínimo, seria como no mundo dos famosos dos EUA, Canadá e Europa: fulano ou fulana (que todo mundo pensava ter essa orientação sexual) sai de Nárnia; o público encara numa boa depois de se espantar no começo (claro que uns e outros idiotas estrilam, mas seus fãs – e mais gente que tem o número certo de neurônios no cérebro – mandam tais idiotas enfiarem sua língua no subilatório e dão a maior força); fulano e fulana segue a sua carreira; e pronto, vida que segue.
Mas estamos em Terra Papagalli. E aqui – nesta luta entre o "rochedo" da bancada evangelicuzinha (que sonha com uma República Teocrática Evangelicuzinha Brasileira), com seus aliados preconceituosos, e o "mar" da liberdade de ser quem você quer ser – uma celebridade se assumir ainda dá panos (muitos panos) pra manga.
O que nos leva ao caso Fernanda Gentil.
Em fins de setembro, a coluna Gente Boa, do jornal O Globo informa que Fernanda Gentil assume publicamente seu namoro com a jornalista Priscila Montaudon, com direito a uma linda declaração de amor e princípios:

“Estou só exercendo meu direito de ser muito, muito feliz. Tenho apenas um recado, e é para os meus filhos, que mais cedo ou mais tarde podem ler ou ouvir tudo por aí: Lembrem de não se importarem com tudo o que dizem sobre nossa vida – o que vale é que a mamãe fala com vocês em casa, olhando nos seus olhos. Não é o que vestimos que muda quem somos, e sim o que fazemos. Lembrem também, sempre, do nosso amor, que não tem cor, sexo ou raça. Amo vocês"

O mais interessante de tudo isso: antes de sua relação amorosa virar notícia para o respeitável público, consta que Fernanda informou, antes, a um de seus chefes no jornalismo da Rede Globo. E a direção da emissora lhe deu a maior força, vê o fato como um bom exemplo contra o preconceito.

(Cá para nós: com esta notícia positiva, pensei em mudar uma das situações de um projeto de série de ficção para a TV que estou elaborando. Tal situação envolve um jornalista de uma rede de TV brasileira que é gay e faz mil e um malabarismos em sua vida profissional para que não descubram sua homossexualidade e não o demitam. Mas depois pensei: se fato semelhante ocorresse com um funcionário da Record – ou mesmo com outra rede de televisão brasileira não religiosa, porém mais conservadora – duvido que a reação fosse a mesma da Globo. Assim, não vou mudar a situação. Ponto.)

Tudo certo como dois e dois são cinco... até que, para variar só um pouquinho, começarama aparecer os bons, velhos e "serenos" (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas, obrigado) comentários da turma da "moral e bons costumes" (assim mesmo, sr. revisor, entre aspas de novo, obrigado). Comecemos por esses, transcritos de um vídeo de Felipe Neto sobre o assunto (sugiro sal de frutas após a leitura):

- REINALDO MURARO - "que vergonha o Brasil esta se transformando em Sodoma e Gomorra estamos perdendo o parâmetro de viver em sociedade entre o certo e o errado cada um cada um mas quem quer respeito se de o respeito" (SIC)

- DREISON LIMA - "Mais um mal (SIC) exemplo a não ser seguido desse povo da globo."

- PENSAMENTOS TD - "Não vou mais assistir o Esporte Espetacular...;( "

- RONALDO JOSÉ - "Eu não vejo mais o programa dela Sport TV, to fora, se globo fosse minha estaria fora também"

- LUCICLEUDON MELLO - "O que faz uma mulher fazer essa vergonha para os filhos?"

- OSCAR AZEDO - "Toda mulher sempre vai gostar de homem! Lembra da namora (SIC) da tamy (SIC)? Agora ela está com um homem."

(Parêntesis: a "Tamy" da tuitada é Tammy Gretchen. A "namora" – acho que ele quis escrever "namorada", mas além de burro e intolerante, é incompetente pra digitar... – é Julia Paes, uma moça morena que foi atriz pornô, chegando a fazer uns vídeos – inclusive com a própria Tammy – e que, tempos depois, se casou com um cidadão que é empresário e evangélico. O que só prova que, bem possivelmente, a ex-"namora" (SIC) da Tammy era bissexual ou curiosa. Ponto. Adiante, e tapem o nariz.)

- EURIPEDES OLIVEIRA - "Pensava que esse era séria e que respeitava a DEUS. Se esquece que DEUS está no comando de TUDO!!! Se a mão dele pesar a quem vai recorrer???!!!!! DEUS está muito triste com essa atitude!!!!!"

- MAURÍCIO OLIVEIRA - "LASTIMÁVEL.... ABOMINAVEL.... POBRE ALMA!!!"

- LEANDRO SILVA - "Isso aí vai totalmente contra a família que Deus criou. Lugarzinho dela no inferno já está preparado!"

- ALESSANDRO ALBUQUERQUE - "desculpa gente mais (SIC) eu adorava essa mulher e agora tenho e nojo q vergonha depois de ser mãe e ser filho se submeter a isso"

- DANNY TAPIA - "ABERRAÇÃO.... POBRE COITADA.."

Pensa que acabou? Não. Tem mais.





Sentiram o drama, não?
Infelizmente pros "conservas" (assim mesmo, sr. revisor, resumindo a palavra "conservadores" porque esse assunto tá me dando preguiça – obrigado), o pessoal que deu a maior força para Fernanda tocou mais alto e mais forte seu instrumento:









vc percebe que no twitter as pessoas são evoluídas quando a maioria ta feliz pela fernanda gentil






















Graças a Deus na minha temeline todos estão felizes e apoiando a Fernanda Gentil não canso de dizer: AINDA BEM EU SIGO AS PESSOAS CERTAS























Fernanda Gentil assume que está namorando uma jornalista e eu acabei de ganhar o dia com essa notícia























Meu respeito e admiração por Fernanda Gentil só aumentou com a notícia. 

Todos temos direito de ser feliz.
❤
























Arrasou Fernanda Gentil você é incrível que seja muito feliz!!























Única coisa que eu tenho pra falar sobre a Fernanda Gentil é: Querida, seja muito feliz! Arrebenta!













Avatar de Super.Danone
Super.Danone
18 horas atrás
Tem que ser visto como exemplo mesmo. Agora vai se esconder por causa de um monte de gente ignorante que se preocupa com a vida sexual dos outros? Ela foi corajosa. Tem muitos gays ai que se escondem por medo e com isso perdem sua liberdade. Dar atenção pra esses homofóbicos burros é perda de tempo. Vai aproveitar a vida!

Há um abismo entre ser LGBT de pereferia e ser LGBT de classe media alta p cima no Brasil. 
E ela só foi assumir depois ja ter uma carreira consolidada e bem sucedida. Será q teria tido as mesmas oportunidades e chegado onde chegou se tivesse se assumido antes? Dificilmente! E a emissora em q ela trabalha teria perdido, o publico teria perdido. Entao eu acho q é esse o recado principal q fica disso. Qtos talentos se perdem no meio do caminho por causa de preconceito? A Globo mesmo segura um monte de artistas no armario q sonham em poder se assumir mas nao o fazem por pressoes da carreira.A comunidade LGBT brasileira deveria ser mais unida e se apoiar mais, como a americana. Aqui quem nao é passivel de sofrer preconceito fica em seus mundinhos, e eqto o movimento "oficial" se alia a partidos comunistas corruptos e fica sem qualquer credibilidade. É complicado.

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Compreendo teus posicionamentos e são válidos, só vou chamar a atenção pra mais um detalhe: "apresentadora do Globo Esporte".
Globo
Esporte
Futebol
Misoginia para caralho.
A posição dela pra sair do armário é bem pior do que a de uma atriz de novela, por exemplo. Ou até de outras jornalistas. Ela é "objeto" pra um monte de homem babaca e como lésbica ela agora pode sofrer ainda mais com isso. Os colegas de trabalho machistas dela poderão fazer piadinhas de merda, fetichizar. Atletas, jogadores de futebol, dirigentes a quem ela possa precisar entrevistar, mais ainda.
Então não é pouco não.

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A maioria dos comentários que eu vi foram de "Eu já sabia", "Eu desconfiava" e por aí vai. Agora olha só que curioso: A Zélia Duncan, segundo eu vi, parece que retomou o casamento com uma atriz que chama Claudia Netto (Ela fazia a mãe do vilão de Flor do Caribe) e foi de um extremo ao outro, com quem comentou demonstrando que ficou feliz com a reconciliação. Mas de fato, acho que mais importante do que noticiar que ela (Fernanda) está namorando outra mulher é noticiar que ela está feliz. E tem uma última coisa. Esse povo que fica torrando o saco paga as contas da Fernanda? Eles são pai ou mãe dela? Ajudam a pagar a escolinha do filho dela? Então por que é que têm que ficar achando ruim se ela namora um cara ou outra menina? Coisa chata, viu... Deixa a criatura ser feliz, ainda mais que a vida dela, pelo menos parece, que está boa... (Deve estar com segurança financeira, a carreira deve também ter ficado em um ponto estável, está feliz com o filhinho dela...)


Também sou plenamente a favor de deixar absolutamente todas as criaturas serem felizes. Infelizmente, ainda falta muito pra isso. Abraços.

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Eu sei que é feio ficar especulando, mas, eu acho que se ela se separou do marido tão pouco tempo depois de o filho nascer, é porque a relação deles não estava boa. Em casos como esse, eu acho que é melhor mesmo o casal se separar do que ficar junto, sofrendo, afetando os filhos com brigas (Porque tem casos que as crianças acham que têm culpa) seja por qualquer motivo. Me pareceu que a Fernanda está de fato feliz e eu acho que quem critica é porque deve estar numa situação com a própria vida que deve estar dando vontade de sentar e chorar...

Melhor: a própria Fernanda Gentil tocou alto e forte seu instrumento para responder a todos os "conservas" sem ter o que fazer (os grifos são meus):

Um minuto pra esse dia acabar.... ufa! Hoje acordei cedo, li umas coisas sobre mim e por um segundo achei que o mundo tinha acabado. Aí olhei pro céu e vi que as nuvens ainda estavam lá. Olhei pra varanda e a piscina do meu prédio ainda estava lá. Entrei nos quartos dos meninos; tudo intacto. Conferi meu pulso: pulsando. Ótimo; há mundo. Mas há também um cheiro forte aqui nesse quarto... olhei pro chão, vômito da Nala. Putz ela comeu algo que não devia! Liga pro veterinário, pede remédio, sai pra comprar. Pensei em pensar sobre o que tinha lido mas minha mãe ligou. Filha, já leu? Já. O mundo continua aí? Sim, e aí? Também. Ótimo. Vamos almoçar? Vamos. Limpei mais um vomitozinho básico, entrei no carro; na reserva. Para no posto. Frentista simpático faz um elogio se referindo a algo que li lá cedo pela manhã. Mensagens lindas no meu celular. Pedi notícias das crianças que infelizmente estavam longe de mim. Ok, os dois estão bem. Ótimo. Telefone tocou, jornalista querendo entrevista sobre o livro. Ótimo. Parei no banco, saquei dinheiro da assistente do lar. Passei no shopping, peguei umas calças que estavam no conserto. Na ida e na volta pessoas abrem sorrisos e me abraçam se referindo também a algo que li agora já há algum tempo. Abri a internet para conferir um endereço, li um comentário chato. Uma imaturidade esperada. Um apoio surpreendente. Ótimo. Meu pai ligou: Amor de Pai, vi aqui. Como você tá? Tudo bem Papi, e você? To amando você. Eu também te amo. Ótimo. Felipe liga. Como você tá? Bem e com saudade. E você? Saudade também, chapa. (Chapa é ótimo). Mensagens lindas no meu celular. Chegamos para o almoço, eu e Mamy. Algumas frases sobre o que lemos por aí, e muitas outras sobre o que precisamos ler mais; o remédio novo para pacientes com HIV, a nova fase da Lava Jato, o acidente de trem nos EUA. A emocionante carta da família do Domingos. Falamos também do vestido que precisamos para um casamento próximo, das escolas das crianças. Próxima campanha da Caslu, financiamento do apartamento, exame de sangue e onde vai ser o Natal esse ano. Ótimo. Durante todo o almoço, mensagens lindas no meu celular. Voltei pra casa e esperei a hora de ir pro trabalho deitada com a Nala, que ainda estava meio enjoadinha. Fui pro trabalho e tive algumas conversas. Ótimas. Ótimas. Ótimas. No trabalho fiquei por algumas boas horas, e ali, na minha terapia, no lugar onde eu faço o que sei de melhor, me desliguei. Sim, porque precisava me concentrar. Afinal, tem Esporte Espetacular no domingo. E tem domingo porque tem mundo. Só desconcentrei do trabalho ainda agora, já aqui em casa, deitada. Olhei pra cima e esbarrei de novo no céu. Adivinha? Tá lá. A piscina? Idem. Os quartos? Também. Eu? Aqui. O mundo? Não acabou... e aliás vai continuar existindo, independentemente da roupa que vestirmos, da cor do nosso cabelo ou da nossa pele. Mas dependendo do que fizermos, ele pode não só simplesmente existir, e sim ser um lugar melhor para os nossos filhos. Agora deixa eu ir porque o inglês do Lucas vence amanhã e ainda não paguei, tem roupa do Gabriel pra lavar e a Nala continua passando mal - e essas coisas sim, são capazes acabar com o meu mundo. De resto, boa noite.

UAU!!!!! Finalmente Terra Papagalli e o mundo estão finalmente mudando, certo?
Nem tanto, caro leitor, nem tanto.
Os apoios a Fernanda Gentil (inclusive da própria Globo) foram ótimos. Mas nada disso ainda muda a cabeça dura e oca de muita gente.
E os desaforos muitas vezes raivosos dos "conservas" (evangelicuzinhos fanáticos ou apenas meros "conservas" idiotas) fazem a gente entender porque muitos gays, lésbicas ou bissexuais – não só as celebridades – ainda hesitam em sair de Nárnia e se assumir publicamente.
A equação que faz muitos gays, lésbicas etc. deles ficarem mesmo contra a sua vontade em Nárnia pode ser resumida em três palavrinhas: Profissão, Família e Amigos. ). No caso das celebridades, acrescentem-se mais duas: Imagem e Público.
IMAGEM - Se for um ator (ou simplesmente uma celebridade masculina bem apessoada), precisa manter a imagem de ícone sexual, de "espada" (ou melhor, de sabre, porque, como dizem os escrotos, "espada corta dos dois lados..." Sim, é disso mesmo que você está pensando...)
Se forem atrizes (ou simplesmente celebridades femininas lindas), tem de manter aquela imagem de mulheres sensuais, que inspiram muitos cretinos (incompetentes para arrumar a sua própria namorada/mulher/ficante) a se masturbarem todo dia pensando nelas... ainda mais depois que fazem ensaios fotográficos para a Playboy ou para a Sexy. (A propósito: você acredita que existe um site ), em que um ilustre cidadão com tempo livre digitalizou e pôs na internet quase todos os ensaios nus destas revistas citadas? Pois é...)
PÚBLICO - E ambos mantém tais imagens com medo de perder anunciantes, medo de perder trabalho no jornalismo (já que falamos de Fernanda Gentil), medo de perder papel em novela... enfim, medo da reprovação pública, de ser repudiado completamente pelo respeitável público.
E já que supunhetamos (© Aldir Blanc) no assunto audiovisual (filmes novelas etc.): ator/atriz declaradamente hetero que faz papel de gay/lésbica, tudo bem... afinal, está fazendo um papel.
Mas, e se um ator/atriz declaradamente gay/lésbica for escalado para fazer um papel hetero? O que pode acontecer? Tipo assim... um galã de novelas sai de Nárnia... e mesmo assim ele é chamado para fazer um galã numa novela, com direito a beijar a mocinha e coisa e tal. Imaginemos, pois, a reação aqui em Terra Papagalli:

IDIOTA 1 - "Colocaram uma bicha louca pra fazer o papel de galã!"
IDIOTA 2 - "Globo só promove viadagem! Por que não chamaram um homem de verdade pra fazer?"

E não se engane: por mais liberal que Hollywood pareça ser hoje, esse assunto de artista sair do armário ou não ainda dá panos pra manga 

Sete anos depois, perguntado pelo jornal "The Advocate" sobre sua decisão, Chamberlain [Richard Chamberlain, galã da televisão americana nos anos 1960, famoso como protagonista de Dr Kildare, que se assumiu gay em suas memórias publicadas em 2003] assegurou que "não recomendaria" a um homem com aspirações de papéis protagonistas em Hollywood que saísse do armário.
"Existe ainda uma tremenda quantidade de homofobia em nossa cultura", afirmou Chamberlain.
Nessa mesma linha se expressou o ator Rupert Everett, que ao contrário de Chamberlain, revelou sua homossexualidade quando sua carreira estava decolando, na década de 1990, e viu as ofertas para fazer papéis principais desaparecerem.
"Foi um assunto enorme durante toda minha carreira", lamentou Everett em entrevista em 2014 ao jornal "The Daily Telegraph", na qual admitiu que, "até certo ponto", havia sabotado sua própria carreira.

Billy Zane poderia falar a mesma coisa. Em 1996, ele foi escalado para ser o protagonista da versão para o cinema do Fantasma – sim, ele mesmo, o "Espírito-que-anda" das histórias em quadrinhos criadas por Lee Falk em 1936  – numa época em que os estúdios seguiam os sucessos de Super-Homem e Batman na telona. O problema é que, pouco antes da estreia do filme, Zane resolveu sair publicamente do armário. O filme fracassou nas bilheterias – entre outras coisas, por causa de um roteiro ruim (a busca por uma das "caveiras de Touganda" (?), que dá ao seu proprietário um poder destrutivo tremendo [?]), com um vilão que nunca esteve nos quadrinhos (um certo Xander Drax, encarnado por um Treat Williams muito desperdiçado) e (d)efeitos especiais que até Zé do Caixão teria vergonha de usar em seus filmes. Um doce para quem adivinhar quem levou a culpa...
Por conta deste fiasco, Zane ficou na geladeira – durante a qual ele "voltou para o armário", ficando até noivo de uma atriz chilena, Leonor Varela – voltando por cima como o noivo-vilão traído de Kate Winslet, em Titanic.
(Para registro: essa "caveiras de Touganda" parece ter inspirado a "caveira de cristal" da última aventura de Indiana Jones, Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal, de 2008. Ou então era parente daquela "piroga de cristal" do comediante Paulo "Ai, como era grande!" Silvino...)
Fossem estes fatos ocorridos na Hollywood dos anos 1930 a 1966, mais ou menos, a coisa seria pior. Tinha um tal de Código Hays que, visto hoje, era a coisa mais cretina que já se inventou em termos de censura no cinema.

Após a década de 1920 apresentar uma grande liberalidade nos filmes produzidos pela indústria cinematográfica dos EUA, houve a reação conservadora da sociedade representada por Hays, amigo do então presidente Herbert Hoover, impondo um código que dizia o que poderia e o que não poderia ser exibido nas produções de Hollywood – tais como vedação de cenas de uso de drogas, adultério, suicídio, sexo, homossexualidade, etc, mostrando apenas modelos corretos para a vida de acordo com as leis de Deus, da natureza e dos homens.

Por "modelos corretos" entenda-se: modelos impostos por entidades religiosas, que bronqueavam demais da conta por causa dos filmes da Hollywood dos anos 1920.
Já seria ruim se tais ditames de origem religiosa fossem impostos apenas aos filmes. Mas tais ditames eram impostos também à vida privada de atores e atrizes fora da tela. Sobre isso, recomendo a vocês um livro XPTO chamado Bastidores de Hollywood: A influência exercida por gays e lésbicas no cinema 1910-1969, de William J. MANN (Edição em português: São Paulo, Landscape, 2002.) Os gays e lésbicas pintaram e bordaram muito em Hollywood... mas sempre dentro do armário. Se as atrizes lésbicas ou bissexuais quisessem continuar trabalhando (e amando suas iguais discretamente), tinham de se esconder no armário e contrair casamentos de fachada. Com os atores gays e bissexuais era a mesma coisa – tudo em nome da imagem.
Descobertas da verdade só depois de algum tempo. Ou através de acontecimentos trágicos.
Vejam o caso de Ramon Novarro, astro de Hollywood nos anos 1920 e 1930. Hoje sabemos que ele era gay – e que teve muitos conflitos íntimos, por ser gay e ser católico. Mas só se soube que ele era gay com a sua morte trágica. Em 30 de outubro de 1968, Ramon levou para sua casa os irmãos tom e Paul Ferguson, para um encontro amoroso. Ao invés de amor, os dois irmãos o torturaram barbaramente e depois cortaram seu pescoço – afinal, na cabeça destes f.d.p.s, "bicha é 'anormal' (SIC) e tem mais que morrer, mas antes tem de pagar para morrer". Só levaram 20 dólares da casa: os dois achavam que Ramon tinha uma grande quantia em dinheiro, mas parece que ninguém disse a este dois imbecis que existem bancos e contas bancárias...

Por incrível que possa parecer, e como ainda acontece, o advogado de defesa tentou convencer a todos de que os irmãos seriam inocentes, e o verdadeiro culpado de sua morte seria mesmo Ramon, ao ter procurado dois garotos de programa. Segundo o advogado, o ex-astro passara 40 anos de sua vida procurando por isso. Puro e inequívoco preconceito. (...) Um final triste e covarde. A dupla de assassinos foi condenada, mas um ano após estavam soltos em liberdade condicional.

(Parece um certo país da América do Sul, que dizem que era a Terra dos Papagaios, onde supostos cristãos impedem sistematicamente no parlamento a adoção de leis contra crimes de ódio homofóbico, não?)
Outro astro do qual só se conheceu sua homossexualidade em seu fim de vida, claro, foi Rock Hudson. Durante toda a sua carreira, ele escondeu a sua homossexualidade – cometendo até mesmo um casamento de fachada com uma fã.
Mas desta vez ele não foi brutalmente assassinado, como Ramon Novarro. Rock Hudson foi uma das primeiras vítimas de uma doença que era chamada de "câncer gay" até que se mancaram que qualquer um podia contraí-la se não tomasse cuidados: a AIDS. E, por assumir publicamente a doença (e a sua homossexualidade), Hudson ajudou a mudar a visão dela por parte do povo dos EUA.
Mas a história dos últimos dias de Rock Hudson não foi só a de um exemplo corajoso – dele e de amigos como Elizabeth Taylor, que o apoiaram até o fim. Foi também a história do "muy amigos", que fizeram de conta que não era com eles. Vão saber quem são nos grifos, que são meus.

Em entrevista para a revista "People", um ex-namorado do ator, Lee Garlington, conta que quando Hudson precisou de cuidados médicos em Paris, em julho de 1985, seu assessor foi autorizado pelo ator a revelar que ele tinha Aids. O astro morreu em outubro, aos 59 anos. O médico infectologista Michael Gottlieb, primeiro a identificar a Aids como uma nova doença, cuidou de Hudson. "As pessoas falam da Aids antes e depois de Rock Hudson. Ele foi o paciente mais influente de todos." O primeiro contato se deu em 1984, quando o dr. Gottlieb recebeu um telefonema de um médico de Beverly Hills sobre uma celebridade que estava doente e queria evitar publicidade.
Ao examinar Hudson, a primeira coisa que chamou a atenção foi a altura do ator, que media 1m93. A próxima foram as feridas do sarcoma de Kaposi que cobriam o corpo do ator e o levaram ao diagnóstico. "Não havia muito o que fazer, não tínhamos antivirais na época. Nas próximas semanas, ele escreveu várias cartas para ex-parceiros sexuais para contar que eles tinham tido contato com alguém com Aids, sem se identificar." Hudson manteve seu diagnóstico em segredo e só contou a verdade para alguns amigos.
Na França, ele se submeteu a um tratamento experimental, conduzido pelo médico Dominique Dormont, que consistia em injeções de HPA-23, droga retroviral que tinha apresentado eficácia em ratos. Eles se encontravam no Hotel Ritz. Foi na sua suíte no hotel que o ator entrou em colapso em 21 de julho de 1985. Ele foi internado no Hospital Americano em Paris e uma agência de notícias francesa divulgou que ele sofria de câncer de pulmão. O dr. Dormont, que era militar, não podia tratá-lo ali no hospital civil, e tentaram obter uma autorização do então presidente francês François Miterrand. Em um comunicado oficial, o assessor de Hudson divulgou a informação de que o ator estava com Aids.
Hudson era amigo do casal Reagan e foi enviado um pedido para que o presidente americano interviesse. A Casa Branca nunca fez o telefonema necessário para Miterrand. Num memorando oficial de 24 de julho, um auxiliar disse que Nancy Reagan "não sentiu que essa era uma questão com  a qual a Casa Branca deveria se envolver". O presidente Ronald Reagan ligou para Rock Hudson para saber como ele estava passando.
O Hospital Americano queria que ele fosse embora. Nessa altura, o ator tinha perdido 35 quilos e estava tão fragilizado que a única maneira de voltar para casa era num vôo direto de Paris para os Estados Unidos. Nenhuma companhia aérea queria aceitá-lo como passageiro. A Air France cobrou 250.000 dólares (480 mil reais no câmbio de hoje) para levá-lo para casa em um 747. 
Ele foi internado no hospital da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), onde recebeu a visita secreta de Elizabeth Taylor em agosto. Ela perguntou se podia abraçá-lo e beijá-lo, porque estava preocupada com a imunidade dele, não com a saúde dela.
Rock Hudson morreu em casa, no dia 2 de outubro de 1985. Antes de morrer, ele doou 250.000 dólares para a pesquisa da doença, e sua doação possibilitou a criação da amfAR (American Foundation for Aids Research), uma das primeiras instituições de apoio à pesquisa e aos doentes de Aids, com a qual Elizabeth Taylor se envolveu.
"Ele sabia de toda a publicidade que o anúncio de sua doença causou e estava feliz de ter vindo a público, de causar um impacto", diz o dr. Gottlieb. "A Aids era tão estigmatizada que os doentes se sentiam abandonados. Tudo o que eles queriam era um sinal de esperança, e ela veio com a declaração de Hudson. Foi o evento que iniciou no país a consciência da epidemia de HIV. Ele foi corajoso e deixou que o seu diagnóstico mudasse a face da Aids." 

Deu para entender porque é que não é fácil para uma celebridade sair de Nárnia?
E graças a trogloditas, ignorantes, de mente completamente ultrapassada – especialmente quando são "cristões" (assim mesmo, sr. revisor, para diferenciar dos cristãos de verdade, que amam uns aos outros, obrigado) – e da imagem a manter, muitas celebridades (especialmente artistas) se sentem obrigados a permanecer dentro dessa jaula, dentro desse armário, impedidos de sair... por pânico da consequência da opinião deles.

Então, porque é que, mesmo com tudo isso, tem celebridades que saem publicamente do armário?
Boa pergunta.
Talvez seja pela mesma razão que uma pessoa comum, não-famosa, se assume gay, lésbica, se descobre e se assume transexual etc., etc.: porque, a certa altura, não dá mais pra segurar (explode, coração! © Gonzaguinha...), chega uma hora que ficar no armário ENCHE O SACO (assim mesmo, sr. revisor, em maiúsculas, obrigado).
(Claro que também há outra boa razão: mesmo as celebridades reconhecidamente hetero volta e meia tem de lidar com boatos de que são gays, mesmo não dando – epa! – motivos para tal. Motivo: para muitos cretinos, só o fato de ser celebridade em geral, e artista em particular – especialmente ser ator, atriz, cantor ou cantora – já "ensina" a muitos deles a homossexualidade ou o lesbianismo... uma ideia mais do que cretina, herdada dos tempos em que atrizes eram obrigadas – mais ou menos dos anos 1920 até 1950 – a fazer exames de doenças venéreas... junto com as chamadas moças-da-difícil-vida-"fácil") – as prostitutas.)
Certo, nunca é fácil sair do armário para ninguém, diante dos "conservas" "ingrinorantes" de sua família (aqueles "tios do pavê" e outros parentes que não cansam de perguntar para o rapaz: "E aí, cadê as namoradas?" e para a moça: " E aí, quando é que você vai se casar?" E se você não tem namorada já ficam se perguntando: será que ele é, será que ela é?) e de sua roda de amigos. Mas a verdade é que sair do armário, com todas as suas dificuldades, é muito melhor do que se esconder, se reprimir):

Apesar de todas essas agruras, há vantagens quando um homossexual revela sua orientação. Uma delas é justamente dar cabo da maledicência. "O indivíduo pode viver de maneira plena sua sexualidade sem se importar com o que vão dizer sobre ele, pois já se assumiu e, portanto, a especulação e a fofoca perdem o sentido, diz [o psiquiatra Alexandre Saadeh, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo]".  O psiquiatra reconhece que se assumir não vai evitar comentários jocosos ou preconceituosos, mas vai aliviar a sensação de viver uma mentira e de estar escondido.

Se não é fácil para as pessoas comuns, imagine para as celebridades. Já vimos que muitos deles se sentem obrigados a ficar dentro de Nárnia, do armário, sentindo-se impedidos de sair por conta da intolerância alheia... por medo, por pânico das consequências da opinião de muita gente sobre isso, e se sentem obrigadas a ficar vivendo uma vida de mentira, ter de fingir na imprensa que tem namorada, ter de contratar modelos pra fingirem que são suas namoradas, ou apelar para amigos para fingirem que são seus namorados... isso quando não entram em namoros com pessoas do sexo oposto para tentar "reorientar" ou "corrigir" sua orientação sexual (o que, para mim, é o mesmo que alguém de olhos pretos fazer tratamento médico para ficar com olhos azuis sem precisar usar lentes de contato...).
Mas quando celebridades saem de Nárnia, não é só para o próprio bem delas, porque já cansaram de se enganar e enganar o respeitável público. Também é para o bem do público comum que porventura estivesse dentro do armário, para diminuir o receio de se assumir, porque ajudam a quebrar estereótipos sobre a homossexualidade – especialmente os difundidos por "conservas ingrinorantes", de que são promíscuos, frágeis e efeminados (como se nunca houvessem ouvido falar de Madame Satã – gay, travesti no teatro... e bom de briga...) – diminuindo a homofobia e estimulando a aceitação. Foi assim quandoa cantora Daniela Mercury saiu do armário e se casou (casou, sim, pentelhoencravado evangelicuzinho!) com Malu Verçosa) – mais ou menos (elas juram que foi coincidência... então tá...) na mesma época em que o pastor deputado Marco Feliciânus fazia e falava m... na presidência da Comissão Direitos Humanos da Câmara.
(Aliás, parece que o extremo felicianismo do próprio Feliciânus – o primeiro e mais eminente portador desta doença emocional, como já disse em texto anterior desta séria série) – conseguiu o efeito oposto do que pretendia...

Para [a antropóloga Mirian Goldenberg, da Universidade Federal do Rio de Janeiro], até mesmo figuras polêmicas como o pastor e deputado federal Marcos Feliciano (PSC-SP) podem estar propiciando, às avessas, uma escancarada nas portas do armário nacional. “Foi bom o pastor existir e ter provocado esse debate”, diz a antropóloga. "Ele acabou fortalecendo todo mundo que era a favor da livre escolha. É muito mais bacana ficar do lado da Daniela Mercury do que das posições retrógradas dele. Enfim, foi libertador para todos: gays ou não gays", diz. De acordo com Mirian, mesmo quem não sai do armário hoje sofre menos, porque a opressão vem caindo.
Ela compara a questão da homossexualidade à do divórcio, um tabu no país até ser liberado no final dos anos 1970. "É a mesma linha de pensamento, e está sendo superada. Os comportamentos mudam, mas os valores demoram a se modificar", afirma. Para ela, se o direito de ser gay, trans ou bissexual já tivesse sido legitimado entre nós, "não existiria Feliciano, ou ele teria menos importância". Assim como a bisbilhotice sobre o que o vizinho faz entre quatro paredes.

Esperemos que sim, doutora Miriam, esperemos que sim.
Porque nenhum gay, lésbica ou transexual quer sair de Nárnia por nada, só de bebedeira: ele quer apenas ser honesto, com os outros e consigo mesmo. Ah, sim, e ser feliz.
Por isso, permitam-me dar um conselho de minha saudosa avó aos que torcem o nariz toda a vez que aquela personalidade sai do armário e a recriminam: macaco, olha o seu rabo (epa!). Deixe quem quer sair de Nárnia em paz e ser feliz E NÃO ENCHA O SACO. Ponto.


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E agora, a nossa indicação desta séria série: Three Veils (que pode se traduzir como Três Véus - EUA, 2011), de Rolla Selbak (https://en.wikipedia.org/wiki/Three_Veils) , com Shetal Sheth (atriz de The World Unseen e I Can't Think Straight, de Shamin Sarif) no elenco.
Sim, o nome Shetal Sheth não lhe é estranho, caro leitor: é a atriz de The World Unseen e I Can't Think Straight, de Shamin Sarif – em dupla com Lisa Ray – dos quais já falamos aqui nesta séria série. Desta vez, Sheth está solo, fora de uma certa zona de conforto dos filmes de Sarif.
Three Veils fala de três moças de famílias oriundas do Oriente Médio que vivem nos EUA. Cada uma tem sua própria história pessoal. Leila (Mercedes Masohn) está prestes a se casar, no entanto, como as abordagens noite do casamento, ela se torna cada vez menos certeza. Amira (Angela Zahra) é muçulmana devota, mas está lidando com profundos sentimentos lésbicos reprimidos. E Nikki (Sheetal Sheth) luta seus próprios demônios com uma vida promíscua, após uma trágica morte na família. À medida que o filme avança, todas as três histórias se desenrolam e misturar-se uns aos outros como as conexões são revelados entre as três mulheres.
Dêem uma olhada no trailer e, se acharem interessante, encham o saco dos distribuidores para trazer para Terra Papagalli.


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