28 maio, 2016

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (XLVIII)

Prezado Ricardo Boechat:

Antes de mais nada, minhas cordiais saudações. Gostaria de cumprimenta-lo por sua visão clara dos fatos e por seus comentários corajosos.
Por isso mesmo, gostaria de consulta-lo a respeito um assunto que me é muito caro – até porque, como roteirista e crítico de audiovisual, faço parte desta área: a cultura.
Como é público e notório, uma das primeiras medidas do doutor Michel Temer, tão logo se tornou presidente interino, foi a extinção do Ministério da Cultura e sua incorporação ao Ministério da Educação – para "cortar gastos". (Palavra que não sei como acabar com um ministério que tinha apenas 0,38% do orçamento – e que tinha esse mesmo orçamento contingenciado pela doutora Dilma Rousseff – ajudaria muito a cortar gastos do governo federal...) Depois de dias e dias de protestos de TODA a classe artística (TODA mesmo), irritada com este rebaixamento de importância da cultura pelo estado brasileiro, Temer voltou atrás.
Mas os dias e dias de protestos também foram dias e dias de aplausos à decisão de extinguir o MinC. E a maioria destes aplausos é de pessoas que nos chamavam de "vagabundos" que mandavam os artistas "irem trabalhar", ou que faziam uma falsa "escolha de Sofia": ou o estado brasileiro incentivava a cultura, ou cuidava da saúde, da educação etc. (como se uma coisa excluísse as outras...). Alguns destes aplausos vinham de artistas como Regina Duarte – que, depois do "medo de Lula" em 2002, não se emenda mesmo... outros destes aplausos vieram dos membros do Movimento Brasil Livre – esta entidade democrática e liberal, mas tão liberal que até hoje se recusa a ter um CNPJ, prestar contas de suas doações e pagar os impostos que nós, comuns cidadãos brasileiros, pagamos.
O que nos leva a um breve parêntesis, a respeito do pedido de uma CPI da Lei Rouanet, protocolado pelo deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF). Diz o nobre deputado em entrevista à Folha de São Paulo:

À Folha, o deputado Fraga diz que não é contra a lei — tampouco deseja o seu fim —, mas alega ser necessário corrigir "a aplicação muito seletiva, apenas para gente consagrada" da Rouanet. "E os nossos artistas de rua? E aquele iniciante que quer gravar um CD e não consegue?", questiona o deputado.

Vamos e venhamos, é um questionamento justo e razoável, e se tal questionamento via CPI resultar na correção dos defeitos e no aperfeiçoamento da Lei Rouanet e de outros mecanismos de estímulo e fomento à cultura no país, isso será ótimo.
Acontece que o deputado Alberto Fraga é coronel da PM do Distrito Federal. E, salvo engano (e mil desculpas aos policiais militares, se houver algum PM em todo o país que possa me desmentir), policiais militares entendem tanto de cultura quanto eu de fabricação de bombas de efeito moral de alta qualidade – ou seja, nada. Logo, parece estar mais perto das multidinhas barulhentas de pessoas que tem raiva de cultura e de quem faz cultura no país. Fora a falta de imaginação para redigir o texto da petição para solicitar a CPI. Matéria de Diego Assis para o UOL revela que o texto apresentado à Câmara para justificar o pedido de abertura de uma CPI para apurar supostas ilegalidades na Lei Rouanet foi copiado, em grande parte, de um artigo que circula há quase um ano na internet sob o título "Os 12 projetos mais bizarros aprovados pela Lei Rouanet". O texto de Leônidas Villeneuve para o site Spotniks, pode ser encontrado aqui
Quando ler o texto, vai ver que ele presta um favor para nós e aponta diversas bizarrices aprovadas pelo Conselho Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), o órgão do MinC que decide quais projetos culturais podem receber o certificado de autorização para captar recursos na iniciativa privada através da Lei Rouanet. 
Ao mesmo tempo, presta um desserviço: como o Spotniks se declara um site de tendência "liberal econômica", ele usa tais bizarrices para dar a entender que elas são normais nos mecanismos de incentivo, e que por isso elas devem ser abolidas e os artistas devem procurar o "livre mercado" para se virar – como se discursava (e se pôs em prática, com resultados catastróficos) na Era Collor. (Qualquer dúvida de que este é o pensamento do site, leia outros textos no Spotniks.)
E, como você mesmo costuma dizer em diversas ocasiões, muitas CPIs acabam virando um circo, que serve mais para que os políticos e outros interessados apareçam (sem precisar de um nariz de palhaço ou de uma melancia pendurada no pescoço...) do que efetivamente para investigar o assunto em pauta e apontar soluções. 
No caso da CPI da Lei Rouanet, pode ser que, ao invés de detectar as falhas da legislação, se preocupe mais em ecoar a raiva de muitas pessoas contra a cultura no Brasil – raiva que vem de muitas pessoas que não sabem a diferença entre proscênio (Para quem não sabe: proscênio é a parte do palco situada à frente do cenário, junto à ribalta, avançando desde a boca de cena até à plateia ou até ao fosso da orquestra, quando houver) e Proctan (um remédio para hemorroidas...) Ou entre um fresnel (tipo de refletor de cinema) e, com perdão do termo, um abajur de puteiro...
E pior do que a raiva de tais pessoas pela cultura é a raiva destas pessoas por que faz cultura, que é irmã gêmea da visão que as pessoas comuns tinham dos artistas (principalmente atores e atrizes nos séculos passado e retrasado). Tico Santa Cruz (outro artista que é xingado por tais pessoas) explica isso melhor em texto para o jornal Brasil de Fato (os grifos são meus):

Antigamente as pessoas que queriam viver de arte eram chamadas de vagabundas. Diziam que era coisa de drogado, de quem não tinha capacidade de arrumar um emprego "decente". Só não era vagabundo quem era famoso. Os artistas de novela, os cantores famosos, quem estivesse na TV, ou nos jornais e revistas, tinham outro tratamento. 
Já a turma do teatro, pintores, artistas plásticos e toda uma gama de pessoas que produziam arte, que lutavam para viver disso, não tinham qualquer reconhecimento.
Pois bem, voltamos no tempo e estamos parados no passado. As pessoas estão gritando aos quatro cantos que “artista é vagabundo”, que se sustenta das “tetas públicas”, de leis de incentivo, e mais um monte de barbaridades.
Não vou tentar convencer ninguém. Só quero dizer uma coisa. Cuidado com quem vocês estão acariciando nesse momento. Cuidado com o que estão tomando como verdade para descarregar o ódio que tomou conta de parte da população.
A arte é objeto de transformação, é um dos pilares da humanidade na formação das civilizações, dos povos, das sociedades. Sem arte a vida seria um tédio completo, e nossa existência seria resumida a doutrinas que nos tornariam apenas escravos. 
Faça uma coisa. Passe uma semana sem ouvir uma música, sem assistir uma novela, sem ir ao teatro, sem ler um livro, ver um filme, olhar para uma escultura, ou para um quadro. Fique um tempo sem dançar, sem recitar uma poesia e me diga o que resta da sua vida. Talvez assim você entenda qual é o valor da arte no seu dia a dia e o valor de um artista na formação da sociedade.

(Para registro: do início do século XX até o final do governo do marechal Dutra, de 1946 a 1950, todas as atrizes eram obrigadas a fazer regularmente exames médicos, especialmente ginecológicos e de detecção de doenças venéreas. Sim, você também acha estranho e não entende porquê. Até a hora em que você é informado de que tal exigência também era feita às chamadas "moças-de-vida-fácil" – as prostitutas, para ser mais exato.)
Pior ainda: tal visão estreita e raivosa da cultura e de quem faz cultura parece prima-irmã de uma visão parecida adotada por um grupo político que pensávamos estar morto e enterrado há mais de setenta anos: os nazifascistas. 
Em 1933, Hanns Johst (1890-1978), autor de teatro que aderiu ao nazismo, escreveu uma peça de nome Schlageter (1933), em homenagem a Albert Leo Schlageter (1894-1923), um oficial alemão da I Guerra Mundial que depois fez parte de uma das Freikorps (antecessor das milícias nazistas SA e SS), fuzilado em 1923, durante a resistência passiva à ocupação francesa no Ruhr (principal região industrial alemã), e que virou um dos primeiros mártires nazistas. A peça só ficou para a posteridade por causa de uma frase que muitos nazistas repetiam como um mantra, com gosto e sem nenhum constrangimento: Quando ouço a palavra cultura, engatilho meu Browning, mais tarde foi simplificada assim: Quando ouço a palavra cultura, saco logo meu revólver.
(Para registro 2: durante o III Reich de Hitler, grande parte da inteligência alemã mais criativa fugiu do país ou foi para naqueles lugarezinhos com a placa Arbeit macht frei na porta – os campos de concentração e extermínio. Só ficaram os membros mais submissos e medíocres desta inteligência – como o próprio Hanns Johst, condecorado e encarregado de presidir a Reichsschrifttumskammer, a Câmara de Escritores do Reich.)
Ou como o general Milan Astray, aliado do generalíssimo Francisco Franco na Guerra Civil Espanhola (1936 a 1939), que costumava bradar com orgulho: Abaixo a inteligência! Viva a morte! – mesmo em templos da inteligência como a Universidade de Salamanca, onde teve de encarar o seu reitor, Miguel de Unamuno (1864-1936) em plena Guerra Civil.
O duelo verbal entre Miguel de Unamuno e o general Milan Astray, durante a celebração da Festa da Raça, em 12 de outubro de 1936, diante de várias personalidades falangistas, está no 2º volume do livro A Guerra Civil Espanhola, de Hugh Thomas. Mas também virou cena de Liberdade, Liberdade, de Millôr Fernandes e Flávio Rangel, que pode ser encontrada aqui, e que transcrevo agora:

TEREZA [Tereza Rachel, 1934-2016, que nos deixou recentemente]
O filósofo Miguel de Unamuno, autor de O Sentimento Trágico da Vida, era reitor da Universidade de Salamanca quando os falangistas tomaram a cidade. No Dia da Raça, uma cerimônia reuniu as mais importantes figuras do poder fascista. E o general Milan Astray, fundador com Franco, da Legião Estrangeira, discursava:

(Inversão de luz. O foco que estava em Tereza dá lugar a uma luz geral.)

VIANNA [Oduvaldo Vianna Filho, 1936-1974]
O fascismo vai restaurar a saúde de Espanha!
Abaixo a inteligência!
Viva a morte!

CORO
(Fazendo a saudação fascista.)
Viva a morte!

VIANNA
Espanha!

CORO
Unida!

VIANNA
Espanha!

CORO
Forte!

VIANNA
Espanha!

CORO
Grande

VIANNA
Viva la muerte!

CORO
Viva!

PAULO [Paulo Autran, 1922-2007]
Senhores!

(Vianna se afasta de Paulo e dirige-se ao Coro.)

CORO
Viva la muerte!

PAULO
Senhores! Meu nome é Miguel de Unamuno. Todos me conhecem. Sabeis que sou incapaz de me calar. Há momentos que calar é mentir. Desejo comentar o discurso – se é possível empregar esse termo – do general Milan Astray, aqui presente. Acabei de ouvir um brado necrófilo e insensato: "viva a morte". E eu que passei minha vida dando forma a paradoxos, devo declarar-vos, ao setenta e dois anos, que um tal paradoxo me é repulsivo. O General Milan Astray é um aleijado.
(Reação do coro.)
Não há nesta afirmativa o menor sentido pejorativo.
Ele é um inválido de guerra; Cervantes também o era. Infelizmente há na Espanha neste momento um número muito grande de aleijados, e em breve haverá um número muito maior, se Deus não vier em nosso auxílio. Causa-me dó pensar que o general Milan Astray esteja formando a psicologia da massa. Um aleijado destituído da grandeza espiritual de um Cervantes tende a procurar alívio causando mutilações em torno de si.

VIANNA
(Olhando fixamente Paulo e em tom de desafio.)
Abaixo a inteligência! Viva a morte!

CORO
Viva!

VIANNA
Viva a morte!

CORO
Viva!
PAULO
(Adiantando-se para Vianna e Coro.)
Senhores!
Este é o templo da inteligência! E eu sou seu sacerdote mais alto. Profanais este sagrado recinto. Ganhareis, porque tendes a força bruta. Mas não convencereis. Porque para convencer é necessário possuir o que vos falta: razão e direito em vossa luta. Considero inútil exortar-vos a pensar na Espanha. Tenho dito.

VIANNA
(Com ar triunfante.)
Abaixo a inteligência! Viva a morte!

CORO
Viva a morte!

VIANNA
Viva a morte!

CORO
Viva!

(lnversão de luz. Paulo abaixa os ombros, derrotado. A luz favorece agora Tereza.)

TEREZA
Unamuno foi preso; e morreu dois meses e meio depois.

(Para registro 3: durante a Guerra Civil Espanhola e a ditadura de Franco, centenas de artistas e intelectuais espanhóis foram para o exílio ou para os pelotões de fuzilamento – tanto dos franquistas, quanto dos republicanos. Basta lembrar uma das mais trágicas mortes no início da guerra; a de Federico Garcia Lorca – assassinado por falangistas em Granada, no início da Guerra Civil Espanhola.)
O pior de tudo isso: toda esta catilinária cretina, de extrema-direita, encontra eco. Abaixo, alguns exemplos de mensagens para o ministro Mendonça Filho, quando a cultura ainda estava sob a asa do ministério da Educação:

"Mendonça se o senhor acabar com a lei Rouanet e a ideologia de gênero e as verbas para grupos estudantis de esquerda nas escolas e faculdades, o senhor já terás feito muito. acabe com essa pouca vergonha, o povo de bem conta com o senhor! que Jeová te abençoe."

"Outra coisa Ministro: tire os núcleos feministas das Universidades! que estão repletos de gays e sapatões."

"Fazendo aluno respeitar professor. Acabando com a porra do PROERD (aula de drogas para crianças que não sabem nada de droga), tirando funk de sala de aula, criando uniforme escolar com saia abaixo do joelho, Acabando com gayzisse, pretice e coisas do genero já ganhará o oscar e o premio nobel da paz."

"Querido Ministro. Você será a esperança de nós pais , que passamos 13 anos entregando nossos filhos nas mãos de exércitos de professores marxistas. Nos ajude. Precisa revisar os livros de História . Estão todos com a verdadeira história alterada por eles, no ensino público e nos livros de escolas privadas. Nos ajude!!!!"

(Vamos ver se eu entendi bem estas "súplicas": para estes beócios, discutir e ensinar direitos humanos, direitos sociais e direitos da mulher – direitos liberais, defendidos desde as Revoluções Americana e Francesa – no espaço devido – os templos da inteligência chamados universidades – é "ideologizar" tudo? Então, convenhamos: estamos mal de direita dita "liberal"...)
A tais cretinos, juntam-se os deslumbrados com o exterior – citados, aliás, nesta tuitada de uma nobre colega de profissão (que, aliás, já trabalhou contigo aí na Band – lembra dela?)



Sério: diante disso – deste anúncio da barbárie próxima – pensei muito em escrever um texto esculhambando esta catervada e explicando melhor os fatos da vida (cultural) brasileira.
Mas alguém fez isso por mim: o diretor de teatro Aderbal Freire Filho, em artigo para O Globo. E foi tão indignado quanto didático – tanto que eu prefiro publicá-lo aqui, acrescido de alguns comentários meus e depoimentos de terceiros. Lá vai:

1 - Artistas trabalham muito;
2 - uma peça de teatro exige meses de ensaios diários de oito horas, além de horas extras de estudo e preparação, e se trabalha também aos sábados e domingos;
3 - bailarinos, por exemplo, têm um trabalho árduo, que exige horas diárias de exercícios, ensaios, cuidados redobrados com o corpo;
4 - um pianista trabalha muitas horas por dia com seu instrumento de trabalho, o piano;
5 - artistas de cinema filmam 12 horas por dia, em jornadas noturnas e jornadas diurnas, com apenas um dia de folga por semana;

Pausa para depoimento de uma profissional de cinema em seu Facebook:

Trabalho com cinema, TV, publicidade, como se diz por aí, "filmagem". Minha atividade tem carga horária de 12 horas de set de filmagem, fora o tempo de deslocamento até o local. Na maioria dos trabalhos as semanas são de 6/1, ou seja, trabalhamos 6 dias, folgamos apenas 1. Trabalho muito.
Não posso expressar o tamanho da minha indignação com esse papo de artista "vagabundo" mamador da teta do estado, entre outros absurdos que surgiram com a queda do MinC.

Se eu quisesse viver do dinheiro público e ter privilégios eu não viveria de cultura. Poderia virar política, quem sabe? Fora a vontade de vomitar diariamente olhando pros colegas de trabalho, acho que tudo seria bem mais fácil.

Vamos em frente, Aderbal.

6 - artistas não vivem da Lei Rouanet, vivem dos quadros que pintam, da música que compõem ou tocam, dos livros que escrevem, das peças de teatro que representam, dos filmes que fazem etc.;
7 - artistas pagam impostos, como todos os brasileiros;
8 - a Lei Rouanet, que não foi criada pelo maldito PT, é um instrumento de captação de patrocínios privados para que sejam possíveis produções de filmes, peças de teatro, espetáculos de dança etc.;

Só para lembrar: a Lei Rouanet foi criada em 1991 nos estertores do governo Collor, e leva o nome do filósofo e diplomata Sergio Paulo Rouanet – ótimo substituto para o cineasta medíocre, recalcado e incompetente Ipojuca Pontes – e aperfeiçoada no governo tucano de Fernando Henrique Cardoso. Ou seja, não é invenção dos petralhas. O que alguns petralhas queriam (inclusive o então ministro da Cultura, Juca Ferreira) era substituir a Lei Rouanet pelo Procultura. O projeto já foi aprovado pelo senado, mas está parado na Câmara.

9 - na Lei Rouanet, o governo apenas autoriza uma empresa a captar patrocínios;
10 - de posse da autorização, a empresa produtora trata de buscar patrocinadores para seu projeto junto à iniciativa privada;

(Ou seja: a Lei Rouanet não dá dinheiro dos cofres públicos: dá é uma autorização para que qualquer proponente de algum projeto cultural vá bater à porta de investidores privados – principalmente empresas, mas também pessoas físicas (sim, você mesmo, que me lê – só que você não sabia disso, né?). Qualquer proponente MESMO. Todos os críticos da lei – a maioria antipetistas – falam que só os "petralhas" se beneficiam dela, mas se esquecem que o Instituto FHC teve autorização, via Lei Rouanet, para captar R$ 6,2 milhões para seu projeto de digitalização e informatização de seu acervo, sendo que R$ 500 mil foram doados pela Sabesp, a companhia de água e saneamento do estado de SP, em plena crise de água – isso em 2014, primeiro mandato de Dilma Rousseff. Isso sem falar dos antipetistas Cláudio Botelho e Regina Duarte. Os espetáculos da Moeller & Botelho Produções - como Os saltimbancos trapalhões, com Renato Aragão, e uma futura montagem de A visita da velha senhora, de Friedrich Dürrenmatt, com Regina, ganharam certificados da Lei Rouanet.)

11 - a Lei Rouanet é uma lei de incentivo fiscal, exatamente nos moldes das que existem em muito maior escala para outros setores produtivos;

(Não custa nada lembrar: os incentivos federais à cultura representam apenas 1,46% dos incentivos concedidos em todas as áreas do governo federal), contra cerca de 11% para a indústria e cerca de 20 a 22% para outras áreas da economia, concedidos pelo governo federal nos últimos 10 anos.)

12 - o custo de um filme, que envolve equipamentos, estúdios etc., quase obrigatoriamente depende de patrocínios privados através da Lei Rouanet;

Nova pausa para outro depoimento de outra pessoa no Facebook:

Essa gente que ama Hollywood acha que os americanos popularizaram sua cultura cinematográfica e seu way of life no mundo espontaneamente, através do livre mercado e da lei de oferta e procura? É sério que esse povo ignora que os EUA subsidiaram fortemente as indústrias cinematográfica e musical para que fizessem sucesso no mundo inteiro? Isso não tira o mérito da cultura dos EUA, que é maravilhosa. Adoro a língua inglesa e meu inglês é americano, não britânico. Amo NY e viveria lá anytime. Não estou chochando a cultura americana de forma alguma, pelo contrário. Certos estão eles, que usaram a cultura (artes cênicas, música, literatura) como estratégia de dominação mundial. É esse o tamanho e a importância da cultura, e é por isso que ela é uma das primeiras coisas a serem atacadas quando se instauram ditaduras e governos ilegítimos.

Avante:

13 - a Globo Filmes usa a Lei Rouanet para produzir filmes;
14 - museus, centros e institutos culturais de grandes empresas também usam a Lei Rouanet;
15 - a maioria das peças de teatro é produzida sem apoio da Lei Rouanet, em regime de cooperativa;

Pausa para mais um depoimento de uma artista de teatro no Facebook (os grifos são meus):

A gente precisa falar de dinheiro. Por orçamentos abertos. Começo com o meu:
questionada sobre a Lei Rouanet, sobre altos orçamentos de artistas, respondi:
Você checou os dados? Entrou no site do Minc e checou a veracidade das informações? Ou está postando uma foto que você viu no face?
O próximo passo é checar os orçamentos, ver pra onde vai cada centavo. Quantas pessoas são empregadas e se o que cada um está recebendo é justo.
Eu, por exemplo, tenho um projeto que foi aprovado no Minc, mas não consegui captar recursos (...) para atuar e num projeto que criei ao lado de outros artistas e parceiros, de longa metragem e teatro, uma linguagem nova que um grupo de teatro chileno desenvolve. Meus gastos fixos são de seis mil reais por mês, que incluem escolinha da [nome da filha, que não vou colocar aqui], compras de supermercado e empregada doméstica (aluguel, e outros ficam com o [nome do marido, que também não vou colocar aqui], meu marido). E empregaria mais outras dezesseis pessoas nesse único projeto. Ou seja, lucraria quatro mil reais por mês.
Viajei por onze países com os espetáculos das cia que faço parte. Na Holanda, na Alemanha, na Bélgica, por exemplo, teatro de pesquisa é subsidiado pelo governo, porque eles entendem que para se desenvolver linguagens novas, o artista pensa no público (mercado) mas tem que ter uma independência de criação para se arriscar.
A aberração da Lei rouanet, a meu ver, é que a escolha dos projetos patrocinados cai na mão dos diretores de marketing das empresas privadas. Além disso, os projetos fazem propaganda de graça para essas empresas com dinheiro público. Isso sim é de se rever.
Se a Cnic, que é a comissão que analisa os projetos, está deixando passar aberrações orçamentárias, tem que botar a boca no trombone mesmo, corrigir os erros da lei. Mas se derrubar a lei e não colocar outra política cultural no lugar, nosso cinema, música, literatura, artes plásticas, teatro não sobreviverão.
Acho que você não quer viver sem arte, né? Eu morreria de tédio, tristeza, desesperança, falta de amor sem música, cinema, dança. Ah, é, a dança, é imprescindível para viver com um mínimo de amor.

Toca o bonde, Aderbal.

16 - é impossível compreender que conta é essa que fazem os difamadores quando dizem que um artista de teatro captou tantos mil reais: um artista em geral não capta ele próprio nenhum centavo; dos tantos mil reais que a empresa que o contratou captou, só recebe a parte relativa ao cachê por seu trabalho; desses tantos mil reais captados, a empresa paga a atrizes, atores, iluminador, cenógrafo, figurinista, diretor musical, assistentes, operadores de som e luz, diretor de palco, camareira, costureiras, cenotécnicos, madeira, tecidos, outros materiais, gráfica, equipe de divulgação (assessor de imprensa, fotógrafo, programador visual) etc. e paga anúncios em jornais e revistas, que em geral custam mais do que os salários dos atores;

Para registro: o próprio Aderbal Freire-Filho foi vítima de uma destas calúnias parecidas com esta. A (In)Veja (só para variar um pouquinho...) defecou... digo, publicou uma reporcagem... ops, reportagem acusando Aderbal de receber um alto salário (R4 91 mil) para apresentar o programa Arte do Artista, sobre arte e cultura, que substituiu o Arte com Sérgio Britto por motivos de força maior (aliás, de força muito maior: Sergio Britto morreu em 2011). Isso fez com que Aderbal publicasse uma carta resposta a estes ilustres beócios na fanpage da Associação Procure Saber no Facebook. Alguns trechos:

A TV Brasil teve um programa de entrevistas com artistas, criado e apresentado pelo ator Sérgio Britto. Quando Sérgio Britto morreu, seu produtor me procurou, para que a tv continuasse a ter esse espaço aberto para a arte brasileira. Aceitei o convite, projetei um novo programa, mantendo os mesmos princípios, mas criando uma nova linguagem. Além das entrevistas, o programa passou a ter uma dramaturgia, que pode incluir a presença de atores.
A TV Brasil, para economizar custos, propôs às equipes de alguns programas, esse entre eles, um regime misto de produção. No nosso caso, a TV entraria com os estúdios, câmeras e técnicos e nossa produção se responsabilizaria por todos os demais gastos, previstos em planilhas que acompanham o contrato.
E assim é feito. Com o valor mensal do contrato, de R$ 91 mil no ano passado, eram pagos: um diretor de produção e quatro colaboradores: um produtor assistente, um diretor de tv, uma editora e um pesquisador e co-roteirista; os cachês dos atores e atrizes convidados; gastos com cenografia; passagens aéreas para entrevistados vindos de outras cidades; passagens aéreas para a equipe, quando vai a outras cidades; hospedagem da equipe em viagens; hospedagem no Rio de convidados de outras cidades; transporte local para convidados; técnicos e aluguel de equipamentos para gravações feitas fora do Rio; custos de material e despesas de administração. É ainda nesse orçamento que está incluído meu pagamento, pelas funções que exerço: roteirista, apresentador e diretor geral.
Neste ano, com a recomendação da presidenta Dilma Roussef de reduzir em 30% os gastos públicos, o programa cortou do seu orçamento passagens aéreas, hospedagens, programas fora do Rio (e, consequentemente pagamento de técnicos e aluguel de equipamento em viagem), cachês para atores, despesas de administração e outras despesas reduzindo o valor mensal do contrato para R$ 68 mil.
Concluo convidando os que não me conhecem, nem conhecem o programa, para que entrem na página da TV Brasil e procurem o programa Arte do Artista. Clicando em Episódios, podem assistir a todos os mais de 150 programas já exibidos. Aí verão alguns dos mais importantes artistas brasileiros de todas as áreas, poetas, compositores, atrizes, atores, artistas plásticos, cineastas, coreógrafas, romancistas, artistas populares, grafiteiros, músicos de rua, etc, enfim, uma mostra rica da grande produção artística brasileira. E, claro, poderão me ver no exercício do meu “cargo público milionário”.

(Conselho de amigo, Aderbal: entra com – mais um – processo contra a Editora Abril e contra a (In)Veja por calúnia e difamação. Além de ganhar um troco, ajuda a apressar a falência daquele valhacouto que é a Editora Abril. Dito isso, vamos em frente.)

17 - a análise técnica de projetos da Lei Rouanet é só uma pequena parte do trabalho do Ministério da Cultura;
18 - o orçamento do Ministério da Cultura é de 0,38% do Orçamento federal;
19 - o Ministério da Cultura não é responsável pela diminuição de sequer um centavo do orçamento do Ministério da Saúde; 

Certíssimo. O que diminui o dinheiro da saúde e da educação pode ser resumido a uma palavra muito simples: ROUBO. Especialmente através de OSs e outros esquemas de desvio de dinheiro via propina – está aí a questão da merenda em São Paulo que não nos deixa mentir. E vai diminuir mais ainda com a proposta do doutor Temer, que quer mandar uma PEC (pai dos burros: sigla de Proposta de emenda constitucional) para mudar o artigo 212 da Constituição Federal, que obriga o Estado brasileiro a investir um mínimo de sua arrecadação – na educação, 18% do orçamento federal e 25% de estados e municípios; na saúde, um mínimo de 13% do governo federal, e12% dos estados e 15% dos municípios. Tradução em português ainda mais claro: acabando com a obrigatoriedade do mínimo de 18% do governo federal (e 25% dos estados e municípios) para a educação, e do mínimo de 13% do governo federal (e 12% dos estados e 15% dos municípios), tais governos (federal, estaduais e municipais) podem aplicar o que bem quiser em saúde e educação.
Inclusive, se quiserem, podem decidir que NÃO VÃO APLICAR NADA.
E assim, podem aplicar este dinheiro em coisas que acharem "mais úteis" ao país – como propinas, obras faraônicas, remunerar os felizes rentistas com juros de 50% ao mês (como no tempo de FHC e Pedro Malan Sem Alça) etc., etc.
(Tal dispositivo nasceu - minha memória é fogo, mas vamos lá - depois de uma matéria de jornal (acho que n' O Globo) lá pelos anos 1980, durante os trabalhos da Constituinte, que mostrava uma cidade do interior do Nordeste e seu orçamento para o ano. Verba destinada para a educação: Cz$ 1 (um cruzado), a moeda da época. Verba destinada para a saúde: NADA.
Avante, mestre Aderbal

20 - a cultura é mais um meio de preservar e melhorar a saúde do povo, de denunciar os problemas de saúde pública, de contribuir para o desenvolvimento intelectual dos profissionais da saúde;
21 - o Ministério da Cultura trata do Plano Nacional de Cultura e de dezenas de programas mais que mapeiam, apoiam, difundem as formas de expressão artística, os costumes, as manifestações culturais diversas que fazem o diverso continente Brasil ser um único e rico país: o Brasil;
22 - Está claro agora?

Mais claro do que isso, impossível.
Mas voltando à vaca fria – ou melhor, à celeuma em torno da extinção e recriação do MinC e da cultura, Boechat.
Por dias e dias de TODA a classe artística (TODA mesmo) protestou contra a extinção do MinC.
E também por dias e dias a turma que nos chamava de "vagabundos" aplaudiu e pediu bis. Entre tais aplausos, os piores (piores mesmo) vieram de um velho conhecido seu.
Sim, ele mesmo: Silas Mala-Sem-Alça-Faia – aquele sereno, humilde, equilibrado e tolerante líder religioso, com quem você travou um debate proveitoso sobre a intolerância religiosa (na época daquele triste incidente com a menina Kailane, fiel do candomblé que levou pedrada de fanáticos), que terminou com um sábio conselho que você deu a este ínclito religioso. (Aliás, tive o prazer e a honra de comentar sobre o debate e o seu ilustre conselho nesta séria série.)

Olha a tuitada abaixo:



Dizem os melhores dicionários (o grifo é meu):

antro
substantivo masculino
  1. 1.
    gruta natural, profunda e escura, ger. servindo de abrigo a feras; furna.
  2. 2.
    fig. local asqueroso, propenso à corrupção, degeneração moral.
    "naquele a. servem bebida falsificada"

Vejamos se entendemos a afirmação de Silas Mala-Sem-Alça-Faia. Durante 12 a 13 anos, quem ficou à frente do Ministério da Cultura e (pelo menos, segundo a minha modesta opinião) tentou, durante oito destes anos, ampliar e democratizar a cultura e a produção cultural no país... e por isso o ínclito pastor o compara à sua igreja-caça-dízimos-de-fieis-para-sustentar-seu conforto? 
(É bem verdade que, nos quatro anos seguintes, esta política quase toda paralisada ou revogada pelas duas primeiras ministras da cultura da doutora Dilma - Ana Autista de Hollanda, tão autista que se recusou a conversar com todas as pessoas que fazem cultura no país... com a "honrosa" exceção do ECAD, que queria continuar com sua "democrática" distribuição de direitos autorais a compositores - tipo assim: de cada R$ 10 arrecadados, cerca de R$ 9 vão para a manutenção da burocracia da entidade, e apenas R$ 1 vai para o autor - e Marta "Relaxa-e-Goza" Suplicy, cujas principais realizações no cargo foram: se aproveitar de uma decisão da CGU e se vingar da Cinemateca Brasileira, cortando seus recursos; e passar por cima da CNIC e dar incentivo de R$ 2,8 milhões para que dois estilistas brasileiros fizessem desfiles de suas coleções em Paris - decisão que você mesmo, Boechat, salvo engano, criticou, chamando-a inclusive de "perua"... Mas será que o que foi feito nos primeiros oito anos foi suficiente para despertar um ódio tão grande de Silas Mala-Sem-Alça-Faia? E por quê?)
Se ficasse só nessa tuitada, já seria suficiente para me levar a usar bastante sal de frutas. Mas teve mais tuitadas cretinas do nobre (SIC) pastor:

– FALA AÍ ! Pede para o novo min da educação e cultura, Mendonça filho, para limpar o ministério desses esquerdopatas q ideologizaram tudo.

– MINISTRO MENDONÇA, põe a companheirada toda na rua, q mamava nas tetas do ministério. LIVRA O BRASIL DESSA CAMBADA. XÔ, FORA ESQUERDOPATAS!

– AVISA AOS ESQUERDOPATAS > Acabou a boquinha no ministério da cultura. Não adianta pressionar , a sopa acabou

(Repetindo, para ver se eu entendi MESMO: para estes beócios, falar de direitos humanos e da mulher – direitos liberais, defendidos desde as Revoluções Americana e Francesa – no espaço devido – os templos da inteligência chamados universidades – é "ideologizar" tudo? Então, convenhamos: estamos mal de cristãos...)
Se ficasse só em Silas Mala-Sem-Alça-Faia, já seria suficiente para me causar uma gastrite.
Mas outro cretino se juntou a eles: Marco Feliciânus, que postou este vídeo abaixo:



Essa dupla vergonha para os evangélicos motivou duas respostas. Uma ampla, geral e irrestritamente indignada, veio do ator e humorista Gustavo Mendes:



A outra resposta veio de um artigo de Hermes Fernandes – pastor evangélico, escritor, conferencista e teólogo com doutorado em Ciências da Religião – para o Diário do Centro do Mundo. Um breve trecho:

Não é somente a classe artística que está de luto. Qualquer ser humano dotado de sensibilidade se sente profundamente insultado com tal medida. Sim, é mais do que luto. É um insulto. E, como evangélico, sinto-me ultrajado por ver um representante proeminente deste segmento sendo o coveiro deste funeral.
Quem sabe agora, com a cultura em baixa, a subcultura gospel consiga se sobressair? Quem sabe, cinemas e teatros que cerrarem suas portas poderão ser comprados a preço de banana por esses ministérios megalomaníacos.
Pelo jeito, estamos mesmo a caminho de um Talibã Evangélico. Se continuar assim, já, já, veremos o anúncio do fim do Carnaval, do Parintins, do Boi-Bumbá e de outras celebrações populares que tanta alegria têm dado ao nosso tão sofrido povo.
Diferentemente desses porta-vozes do divino, Jesus realizou Seu primeiro milagre para que a festa não terminasse antes da hora. Se fossem esses estraga-prazeres, em vez de transformar água em vinho, teriam sabotado a festa, transformando o vinho em refresco do mais aguado e sem graça.
O Cristo que emerge das páginas do Novo Testamento não é contra a ciência, nem contra qualquer segmento social, muito menos contrário à cultura de um povo. Que bom seria se os líderes da igreja evangélica brasileira deixassem de ser discípulos de Olavo de Carvalho e se tornassem verdadeiramente discípulos de Jesus.
Se deixassem de ser assombrados pelo fantasma do comunismo e passassem a enxergar em cada manifestação cultural a silhueta de Cristo, mesmo entre o nevoeiro de nossos preconceitos idiotas.

Daí, diante dessa situação, gostaria de lhe fazer duas perguntas.
Primeira pergunta: se estes ilustres próceres evangélicos (Silas Mala-Sem-Alça-Faia e Marco Feliciânus) acham que gastar com cultura é desperdiçar dinheiro de nosso impostos, e todos devem contribuir para resolver a crise, porque é que eles não dão o exemplo e renunciam às isenções fiscais para as suas igrejas?
Sério: igrejas como a de Silas Mala-Sem-Alça-Faia e Marco Feliciânus NÃO PAGAM IMPOSTOS em cima dos dízimos que arrancam de seus fieis. Graças a isso, por exemplo, Silas Mala-Sem-Alça-Faia pode comprar um avião de R$ 12 milhões"para uso de sua igreja" (leia-se: DELE), e Marco Feliciânus sempre tem dinheiro para fazer chapinha no cabelo, sobrancelhazinha, comprar ternos caros etc.
Isso é justo com os fieis de sua igreja, que trabalham duro, pagam os seus impostos (assim como nós) e ainda são obrigados a contribuir dízimos para o suntuoso sustento destes cavalheiros?
Segunda pergunta: se estes ilustres próceres evangélicos (Silas Mala-Sem-Alça-Faia e Marco Feliciânus) acharam boa a extinção do Ministério da Cultura porque acham que fomento à cultura pelo estado brasileiro é "mamar nas tetas do estado", porque eles mesmos não dão exemplo e apresentam um projeto de lei, revogando a lei 12.590, de 9 de janeiro de 2012?
O texto da lei, que vai abaixo, é curto e grosso:

LEI Nº 12.590, DE 9 DE JANEIRO DE 2012.

Altera a Lei no 8.313, de 23 de dezembro de 1991 – Lei Rouanet – para reconhecer a música gospel e os eventos a ela relacionados como manifestação cultural.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA
Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o A Lei no 8.313, de 23 de dezembro de 1991, que restabelece princípios da Lei no 7.505, de 2 de julho de 1986, institui o Programa Nacional de Apoio à Cultura (PRONAC) e dá outras providências, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 31-A:

Art. 31-A. Para os efeitos desta Lei, ficam reconhecidos como manifestação cultural a música gospel e os eventos a ela relacionados, exceto aqueles promovidos por igrejas.”

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 9 de janeiro de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF
Vitor Paulo Ortiz Bittencourt

(Sim, isso mesmo: essa lei é dos tristes tempos em que a doutora Dilma Rousseff tentou – sem resultado – compor com a bancada evangelicuzinha – inclusive vetando erroneamente o kit Escola Sem Homofobia, vulgo "kit gay". E ainda se desconfia que a doutora Dilma foi levada a erro por esta bancada – isto é, ao invés do kit para professores do ensino médio, a bancada evangelicuzinha, desonestamente, apresentou um power-point com vídeos e imagens feitos pelo Ministério da Saúde para usuários de drogas usuários de drogas e para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, onde sexo e uso de drogas são mencionados eilustrados de forma explícita.)
Ora, o trecho "exceto aqueles promovidos por igrejas" é um tanto difícil de cumprir. Primeiro, porque muitos dos promotores de eventos de música gospel são entidades laicas ligadas a igrejas evangélicas. Segundo, porque muitos dos astros cantores de música gospel também são pastores evangélicos – como a Ana Paula Valadão, da banda Diante do Trono (será que é ligada à igreja evangélica do mesmo nome?), que anunciou uma campanha de boicote à cadeia de lojas C&A,por causa de sua propaganda para o Dia dos Namorados.
Terceiro, porque, se o art.31-A continuar em vigor, a música gospel terá direito aos mesmos mecanismos oficiais de apoio á cultura – inclusive à Lei Rouanet, que eles também tanto malham.
Daí, você não acha que eles deveriam dar o exemplo?
Esperando pronta resposta, e transmitindo-lhe os meus mais sinceros votos de estima e consideração, subscrevo-me,

Atenciosamente...

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Para quem não se lembra, recoloco a gravação, bem como a transcrição (e grifos, que são meus), do "sábio conselho" que Ricardo Boechat deu à Silas Mala-Sem-Alça-Faia.

BOECHAT - "[O pastor Silas Malafaia], figura que dispensa maiores apresentações...
LOCUTORA - Acabou de colocar no Twitter...
BOECHAT - ...acabou de colocar no Twitter dele um desafio pra debater comigo ao vivo, pra eu 'parar de falar asneira no programa de rádio sozinho, que é mole... deixa de ser falastrão... não incite o ódio'. 'Avisa ao jornalista Boechat que está falando asneira, dizendo que pastores incitam os fiéis a praticar intolerância... Verdadeiro idiota'... Ô Malafaia, vai procurar uma rola, vai. Não me enche o saco. Você é um idiota, um paspalhão, um pilantra, tomador de grana de fiel, explorador da fé alheia. E agora vai querer me processar pelo que eu acabei de falar, que é o que você faz. Você gosta muito é de palanque. Eu não vou te dar palanque porque tu é um otário, tu é um paspalhão. O que eu falei e repito, e não vou partir pra debate com você porque não vou te dar confiança, é o seguinte. Que é no âmbito de igrejas neopentecostais que estão acontecendo atos de incitação à intolerância religiosa, mais do que em outros ambientes. Em nenhum momento, é pegar minhas falas que estão gravadas, eu disse qualquer coisa que generalizasse esse comentário, qualquer coisa. Até porque, diferente de você, não sou um idiota. Então você é um homofóbico, você é uma figura execrável, horrorosa, e que toma dinheiro das pessoas a partir da fé. Você é rico. Eu não sou rico porque tomei dinheiro das pessoas pregando salvação depois da morte. O meu salário, os meus bens, o meu patrimônio, veio do meu suor, não veio do suor alheio. Você é um charlatão cara, que usa o nome de Deus, de Cristo, para tomar dinheiro dos fiéis. Você é tomador de grana. Você e muitos outros. Tenho medo de você não, seu otário. Vai procurar uma rola, repetindo em português bem claro. Bom...”
LOCUTOR - Posso chamar aqui...
BOECHAT - Só um minutinho... O pastor João Melo, da Igreja Batista Vila da Penha... onde tem três mil membros... e ali na Vila da Penha onde foi o ataque...
LOCUTOR - Foi em São João de Meriti...
LOCUTORA - ...da menina Kailane...
BOECHAT - ... Kailane... Kailane Campos e a avó dela, recentemente... o ataque de... que não se sabe ainda de quem foi... mas de intolerância religiosa, jogaram uma pedra na menina, levou três pontos na cabeça... o pastor João Melo me mandou uma mensagem pelo SMS... dizendo o seguinte... "Sou pastor da Primeira Igreja Batista em Vila da Penha, onde temos três mil membros, que fica no Largo do Bicão... e ontem"... portanto, antes mesmo do café da manhã do cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta, esta manhã... o pastor João Melo já tinha ontem recebido a menina Kailane, e a família da Kailane... "num gesto pra repudiar o ato de pessoas intolerantes que NÃO representam"... ele enfatiza aqui... " NÃO representam os evangélicos e muito menos o Cristo...Neste domingo, em vez de realizarmos o culto pela manhã, normalmente, como acontece sempre, estaremos participando da movimentação em favor da liberdade e da tolerância religiosa. Abraço, padre (SIC) João Mello." Esse é o tipo de pastor que nós respeitamos e doa quais precisamos pra conduzir os rebanhos de fiéis... é deste tipo de gente que estou falando quando falo que a igreja tem que tomar uma posição... assim como acho que as igrejas evangélicas também tem que tomar uma posição... atitudes como essa, do pastor João Mello, e não de outros que tentam... criar uma confusãozinha pra crescer na área deles... vai crescer sozinho, malandro... em cima de mim não vai não."





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De resto, fica mais um útil conselho para a turma de Silas Mala-Sem-Alça-Faia, Marco Feliciânus et caterva:




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Antes de nossa indicação para esta séria série (e já que falamos de internet), um conselho de amigo: dê uma olhada em web séries na internet. Algumas são ótimas, como a brasileira RED, que já caminha para a terceira temporada. Tem também Anyone but me (2013-2014) de Susan Miller e Tina Cesa Ward, com Rachael Hip-Flores e Nicole Pacent como protagonistas. E ainda Carmilla, web série de Jordan Hall baseada na personagem criada por Joseph Sheridan le Fanu (1814-1873) em seu conto de 1872, que antecedeu Drácula. A adaptação toma a forma de uma comédia de humor negro, muito em torno da relação entre Laura (Elise Bauman), uma americana ingênua e comum que vai estudar na Universidade Silas, na Estíria (o nome Silas, aliás, vem de outra obra de Le Fanu, a novela Uncle Silas, de 1864), e Carmilla (Natasha Negovanlis).
Pois Elise Bauman e Natasha Negovanlis estão em nossa indicação desta séria série: a comédia Almost adults, de Sarah Rotella (EUA, 2015).
Almost adults gira em torno de duas melhores amigas, Mackenzie (Elise Bauman) e Cassie (Natasha Negovanlis), em seu último ano de faculdade, enquanto fazem a transição para a vida adulta. Mackenzie abraça sua sexualidade e tenta recuperar o atraso em tudo o que ela perdeu durante seus anos de adolescência, enquanto Cassie – bem juju-carente – termina um longo relacionamento com um namorado e descobre que sua vida não está indo como planejado. Ambos lutam para manter sua amizade juntas, como eles começam a crescer separadas.
Eu disse amizade? Na verdade, a relação entre Cassie e Mackenzie parece mais um namoro lésbico... platônico. (Isso existe, meninas? Isso me lembra uma frase que a turma do antigo jornal O Pasquim falava a respeito disso: "Para curar amor platônico, só mesmo uma trepada homérica". Por outro lado, como a turma do Pasquim – ou o que sobrou deles, Ziraldo e Jaguar – é homofóbica pra chuchu – CQD a fala de Ziraldo, que eu já comentei em outro post desta séria série, melhor deixa-los – e esta frase – pra lá...)
O fato é que, quem for fã da web série Carmilla e quiser ver Laura e Carmilla... digo, Elise e Natasha em tela grande e em novos papeis, já sabe: encha o saco do distribuidor de audiovisual mais próximo para que Almost adults venha para Terra Papagalli.
Enquanto isso, curtam o trailer.



Ah, em tempo: a primeira e a segunda temporada da web série Carmilla, além da temporada zero (Temporada zero? WTF?) também estão no YouTube. Enjoy.