22 julho, 2014

DA SÉRIA SÉRIE "FILMES QUE JAIR BESTEIRARO ET CATERVA A-DO-RA-RI-AM..." (XXXV)

Ilmo. Prof. Dr. Roberto de Souza Salles, Magnífico Reitor da UFF;
Ilmo. Prof. Dr. Sidney Luiz de Matos Mello, Vice-Reitor (e futuro Reitor) da UFF:

Antes de mais nada, cordiais saudações.
Isto é, na medida do possível.
Isto porque talvez os senhores não gostem, mas achei pertinente apresentar a nossa posição face aos desdobramentos resultantes dos fatos ocorridos em 28 de maio deste ano da graça de 2014, no Campus do Polo Universitário de Rio das Ostras da Universidade Federal Fluminense.
Para quem voltou de Marte ontem, depois de meio século de residência no planeta vermelho:
Em 28 de maio deste ano, como os senhores já sabem, foi realizado o II Seminário de Investigação e Criação do Grupo de Pesquisas UFF/CNPq: Cultura e Cidade Contemporânea: arte, política cultural e resistências, sob o título CORPO E RESISTÊNCIAS. As atividades contemplavam comunicações orais dos estudantes bolsistas (CNPq e FAPERJ) sobre suas pesquisas de iniciação científica e, ao final, a apresentação de uma performance do Coletivo de Arte Autonomista COYOTE, que ofereceu gratuitamente o seu trabalho, como forma de apresentar uma prática do uso do corpo em performances artísticas e políticas. 
Cabe relembrar que tais performances corporais seguem uma tradição da arte contemporânea, que vem dos happenings dos anos 1970 aos mais recentes trabalhos da sérvia Marina Abramovic, passando pelos trabalhos do Living Theatre, de Julian Beck e Judith Malina. Claro que ninguém é obrigado a saber disso, mas uma breve pesquisa (mesmo que no bom e velho Google - digitar performance, ou performance corporal artística, ou happening, ou Marina Abramovic) poderia esclarecer isto, e informar a quem não sabe disso que performances corporais, como o Xereka Satanik, são destinadas, sim, a chocar, mas que, a partir do choque, façam pensar sobre o tema da mesma. O tema da performance foi a onda de estupros que vem ocorrendo em Rio das Ostras, inclusive contra alunas da Polo Universitário de Rio das Ostras da UFF. Tais eventos integraram um conjunto de atividades acadêmicas, destinadas a estudar as diversas manifestações de Cultura e Arte. Por isso, necessita ter plena liberdade para tratar de assuntos e performances relacionados aos temas pesquisados que vêm sendo desenvolvidas ao longo dos últimos anos. Claro que, como professores doutores desta mesma universidade, os senhores devem saber disso mais do que ninguém.
Entretanto, como o público em geral extra acadêmico não é obrigado a saber disso (o que, volto a dizer, saberia se pesquisasse sobre o assunto), o que se seguiu foi uma apropriação sensacionalista da performance por vários blogs e jornais, distorcendo acintosamente os fatos. Dentre estes sites e blogs que distorceram os fatos ao ponto do sensacionalismo mais extremo, destacamos os sites SRZD, do jornalista Sidney Rezende, e Faca na Caveira, editado por paramilitares (comentário que, curiosa e "corajosamente", apagaram, sabe-se lá por quê...), bem como o colunista de extrema direita da revista Veja, Reinaldo Azevedo, famoso por sua "imparcialidade" em política... Um trecho da diatribe de Reinaldo Azevedo, só para lembrar: Acreditem: ou aquela gente sai logo de lá – refiro-me ao Palácio de onde emana a barbárie – ou não haverá mais ponto de retorno. A próxima etapa será subir na copa das árvores e começar a andar de… cipó.
(Ora, desde quando Reinaldo Azevedo exerce o cargo de secretário de Ensino Superior do MEC, para ditar normas sobre como a universidade deve realizar suas pesquisas? E, considerando que o pessoal do site Faca na Caveira não conhece sequer a Declaração Universal dos Direitos Humanos - já que sua única contribuição para tal assunto é a velha tese do "bandido bom é bandido morto" - desde quando eles podem impor regras sobre o que deve ou não merecer pesquisa na universidade? Minto: houve um período de 21 anos – de 1964 a 1985 – em que pessoas de pensamento parecido com os deles impuseram suas asfixiantes normas à universidade.)
Face a este clima, o corpo docente do Departamento de Artes e Estudos Culturais/ RAE do Instituto de Humanidades e Saúde/ IHS enviou aos senhores (e ao público em geral) uma carta de esclarecimento acercados fatos. O mesmo fez o chefe do Departamento de Artes e Estudos Culturais, Daniel Caetano (responsável, entre outros, pelo curso de Produção Cultural no PURO-UFF), e o Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Estudos Contemporâneos das Artes/PPGCA. Todas esta notas são extremamente claras a respeito do fato de que não houve nenhuma atividade ilegal ocorrida na noite de 28 de maio.
A partir destes relatos, como professores doutores desta mesma universidade, esperava-se que os senhores tivessem a disposição de rebater a baixaria criada em torno destes fatos. 
Ao invés disso, infelizmente, os senhores preferiram ignorar seus colegas professores e a sua narração dos fatos como eles aconteceram, preferindo abraçar a distorção sensacionalista e interesseira dos fatos, destinada a agradar parcelas minúsculas e retrógradas da sociedade – tanto as que acham que o mundo deve ser moldado à sua conformista e conservadora imagem e semelhança, quanto as que possuem interesses políticos retrógrados, com o objetivo claro de retroceder a agenda progressista de toda a sociedade – objetivos estes que incluem a censura, criminalização e judicialização da pesquisa acadêmica.
Certo, nós entendemos (e também defendemos) que a academia pode e deve dialogar com a sociedade que está além de seus muros. No entanto, tal diálogo não pode e não deve ter como base a subserviência a todo e qualquer tipo de interesse externo (e prejudicial) a seus fins. (Sobre isso, já disse o sábio Millôr Fernandes, com justa razão e falta de gentileza: "Quem se curva aos opressores, acaba mostrando o rabo aos oprimidos.") A universidade pública é um espaço de estudo e conhecimento que não deve ser censurada por causa de informações deturpadas em blogs e jornais.
Infelizmente, é o que está acontecendo: além de não rebater o linchamento midiático de seus colegas professores, os senhores instalaram uma comissão de sindicância, para "apurar" o fato. Até aí, tudo bem: a princípio, os senhores precisam de mais fatos para ser melhor informados, e uma comissão de sindicância talvez fosse necessária... se fosse mesmo para apurar os fatos. Ao que parece, não é isso que está acontecendo. Notícias publicadas no site do jornal O Povo (Fortaleza - CE) poderiam ser consideradas, no mínimo, contraditórias, se não sinalizassem a posição atual dos senhores.
Primeiro, notícia publicada em 30 de maio (o grifo é nosso): Uma confraternização do Seminário Corpo e Resistência, batizado de “Xerexa  (SIC) Satânik” realizado na última quarta-feira, 28, será alvo de investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro. A denúncia foi encaminhada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), onde foi realizado o evento do curso de Produção Cultural da instituição em Rio das Ostras.
A seguir, notícia do site do mesmo jornal, de 3 de junho (o grifo, mais uma vez, é nosso): Uma comissão da faculdade ainda vai avaliar fotos e informações de alguns alunos nas redes sociais. “A administração central da UFF só vai se posicionar depois que a comissão apurar os fatos”, informou a assessoria.
Ora, se a UFF já encaminhou denúncia ao Ministério Público fluminense, mesmo antes do término dos trabalhos da comissão de sindicância, é sinal de que os senhores já se posicionaram a respeito do fato. E infelizmente, do lado dos "Jair Besteiraros" da vida, para quem a liberdade é um estorvo.
Ainda sobre isso, com licença do autor, trecho de outro texto a respeito deste assunto (os grifos e links são meus):
Alguém poderia aqui argumentar que uma comissão de sindicância seria para apurar o caso, e portanto não representaria uma conclusão e um posicionamento da reitoria. Mas não é isso que vemos quando o vice-reitor, então reitor em exercício, publicou uma nota nosite da universidade dizendo que “não compactua com qualquer tipo atividade que,desvirtuando de sua essência institucional, extrapole os limites do razoável,atentando aos valores da liberdade e igualdade, ou ofendendo a dignidade da pessoa humana” e convocando todos que tenham presenciado “possíveis ilegalidades” a denunciá-las à ouvidoria da universidade, cujo número foi emseguida fornecido. Cabe perguntar o que, numa universidade, seria “extrapolar o limite do razoável”? Seria a física quântica, ou as teorias da sexualidade infantil de Freud, quando foram anunciadas, algo que estaria “nos limites do razoável”?
A reitoria pareceu, com essa nota, incentivar um clima de perseguição entre os próprios membros da comunidade universitária, de patrulha moral, de censura e auto-censura dentro do campus, propalando um clima de denuncismo a partir do discurso feito por jornalistas (ou não) de posições ideológicas muito bem definidas. Não importa que a notícia, da forma como foi dada, tenha ganho forte repercussão em todos os órgãos de imprensa, o que importa que esta aconteceu a partir de uma total deturpação dos fatos e de um clima de linchamento e sensacionalismo que deveria caber a uma universidade se contrapor à altura. Fundamentalmente o que assistimos foi uma tentativa de intimidação e de censura dos professores e alunos em seus processos de pesquisa e produção acadêmica, e de artistas em seus processos de criação (processos que podem se confundir num curso de artes). Insistimos, nos assusta o fato como a reitoria ignorou (e sequer ajudou a levar a público) os esclarecimentos e os posicionamentos públicos de seus professores, não os defendendo de um processo de intimidação vindo desde fora. Ao contrário, a reitoria pareceu querer intimidá-los e censurá-los também. Chama a atenção, por exemplo, o fato de que a reitoria não defendeu a universidade da “acusação” de “promover rituais satânicos”, além de não causar nenhuma estranheza a reitoria estar confiando num blog, e num discurso, claramente impregnado de um certo fundamentalismo e uma certa intolerância religiosa e social que tem se propalado perigosamente em nossa sociedade. Chama também a atenção ainda a total falta de mobilização da reitoria da UFF (e da sociedade em geral) a respeito do alto índice de estupros na cidade de Rio das Ostras, que ameaça inclusive as alunas da universidade.

O autor do texto acima citado se chama Rodrigo Guerón, professor adjunto do Instituto de Artes da UERJ. Desnecessário dizer que os senhores devem conhecê-lo: como professor, participou de uma manifestação de alunos e professores deste instituto, em apoio aos professores do PURO-UFF e contra o linchamento midiático que estes, mais os alunos e artistas, estão sofrendo. Aliás, esta foi mais uma das muitas manifestações da comunidade acadêmica, de suas entidades (entre elas, a União Nacional dos Estudantes – UNE) e da sociedade civil contra tal linchamento – manifestações que os senhores também ignoraram.
E dizemos que é desnecessário dizer que os senhores devem conhecer o professor Rodrigo Guerón porque um dos senhores (no caso, o Magnífico Reitor), recentemente, entrou com uma ação na justiça contra ele. Crime do qual ele é acusado: criticar a atitude dos senhores a respeito do linchamento midiático ora sofrido por seus pares – sob a capa de "ação de reparação por danos morais". Talvez os senhores ainda não tenham percebido, mas levar seus críticos à justiça não adianta muito – pelo menos, para suas imagens.
Em termos de cultura, o senhor, Magnífico Reitor, já nos devia as obras de reforma do Centro de Artes da UFF, que ficou quatro (repetindo: QUATRO) anos fechado, para uma obra prevista para um (repetindo: UM) ano.
E o senhor, Vice-Reitor, é agora o reitor eleito da UFF. E todas as atitudes cometidas em torno deste assunto (a comissão de sindicância, a nota oficial estimulando a "deduragem" e corroborando o linchamento moral e público de seus pares) foram cometidas, salvo engano, enquanto V. Sa. era reitor em exercício. Como fica sinalizada a sua forma de diálogo com seus colegas professores, com os estudantes e com os servidores? Será, praticamente, nenhuma?
Bem, nós, de SOMBRAS ELÉTRICAS, lidamos com o cinema - e, por tabela, claro, lidamos com cultura. E isso implica em compreender que, para a cultura acontecer, ela precisa de liberdade, assim como uma planta precisa de sol e água. Na verdade, não apenas a cultura, mas toda e qualquer atividade criativa humana. 
Talvez os senhores ainda não tenham percebido, mas vamos colocar ainda no terreno das hipóteses: e se um dia alguém ou alguma parcela da sociedade resolva - porque não lhe agrada ou porque, segundo esta pessoa ou setor, não lhe faz sentido - querer censurar alguma pesquisa em alguma de suas áreas (no caso do senhor, Magnífico Reitor, em Medicina ou Veterinária; no caso do senhor, prof. Sidney Mello, em Geologia)?
Desta forma, nós, de SOMBRAS ELÉTRICAS, manifestamos a nossa solidariedade para com os professores do Departamento de Artes e Estudos Culturais do Instituto de Humanidades e Saúde do Polo Universitário da UFF em Rio das Ostras, bem como para o professor Rodrigo Guerón e para qualquer pessoa que venha a ser ameaçada por defender a liberdade criativa e de expressão. 
Também manifestamos a nossa esperança de que os senhores voltem a dialogar com a comunidade acadêmica e com a sociedade em geral - não a meia dúzia de três ou quatro que sente urticárias com a liberdade, mas a sua defensora.
Afinal, como já disse Cecília Meireles, em seu Romanceiro da Inconfidência:

Liberdade - essa palavra,
que o sonho humano alimenta:
que não há ninguém que explique,
e ninguém que não entenda!

************************************
Agora, mudando de assunto: qual filme indicar para esta séria série?
Ah, já sei: vou indicar três de uma vez.
Dois deles - já que falamos de ensino e liberdade (duas coisas que, em tempos idos, pareciam antagônicas; hoje, são amigas) se passam em colégios internos. 
Um nós já vimos (a menos, claro, que você tenha sido residente no planeta Marte etc., etc.), e até hoje adoro este filme: Sociedade dos Poetas Mortos (1989), de Peter Weir - ou: como John Keating (Robin Williams), um professor de poesia nada ortodoxo, entra em conflito com o pensamento conservador de uma escola preparatória para jovens, inspirando os seus alunos a perseguir as suas paixões individuais e tornar as suas vidas extraordinárias, ser "livres pensadores", e não deixar que ninguém condicione a sua maneira de pensar, sem deixar de usar o bom-senso.
O segundo é Cracks (batizado -  com muita imaginação... - como Sedução - 2009), de Jordan Scott - não por acaso, filho de Ridley Scott (Alien) e sobrinho de Tony Scott (1944-2012)
A trama se passa nos anos 30, em um internato inglês isolado, onde as jovens alunas se inspiram em sua professora de natação, a dinâmica e misteriosa senhorita G (Eva Green), que as seduz (não necessariamente sexualmente...) com histórias românticas do mundo exterior, encorajando-as a saírem em busca de liberdade e independência. Eis que a rotina do universo do colégio é alterada com a chegada de uma estranha aluna aristocrática e experiente, Fiamma (a espanhola Maria Valverde, prêmio Goya de atriz revelação por A fraqueza do bolchevique, 2003). O duelo (talvez de sedução ?) entre professora e aluna é inevitável, e mais não conto, para não estragar.
E, já que falamos de liberdade e de Eva Green (que merece, um dia, um perfil em outra de nossas sérias séries, "as belas da tarde e da sessão da tarde"...), indicamos, finalmente, The Dreamers (Os sonhadores, 2003) - ou: um triângulo amoroso-libertário entre dois irmãos, Theo (Louis Garrel) e Isabelle (Eva Green), e um estudante americano, Mattew (Michael Pitt), em pleno maio de 1968, em Paris. Também já vimos no cinema (a menos, claro, que você tenha sido residente no planeta Marte etc., etc.), mas vale a pena ver de novo em DVD.
Boa degustação de liberdade.
Aliás,

Viva a rapaziada! O gênio é uma longa besteira!
(Oswald de Andrade)

13 julho, 2014

24 HORAS SEM SONHO (ou: POR QUE CARGAS D'ÁGUA A TV BRASIL CONTINUA A SER ESTA BAGUNÇA?)

Excelentíssimo sr. ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República;
Ilustríssimo sr. Diretor-Presidente da Empresa Brasil de Comunicação, Nelson Breve;
Ilustríssimo sr. Diretor de Produção, Rogério Brandão
Ilustríssimo sr. Diretor de Conteúdo e Programação, Ricardo Soares
Ilustríssimos srs. membros dos Conselhos Administrativo, Fiscal e Curador da Empresa Brasil de Comunicação:

Nesta quinta feira, 10 de julho (presumo...), o sr. Alexandre Toledo, em nome da Gerência de Licenciamentos Nacionais da EBC, enviou o seguinte email para dona Alice Gonzaga Assaf, diretora presidente da Cinédia:



Foi o que a Cinédia fez: divulgou para todo o mundo, pela internet e todas as redes sociais, que um filme da Cinédia, 24 horas de sonho, seria exibido em uma TV pública brasileira, que sempre exibiu cinema brasileiro.

É muito raro a televisão aberta exibir filmes anteriores a 1950.
Nesta sexta dia 11 as 22:30h vai passar 24 HORAS DE SONHO na TV Brasil. É uma oportunidade para conhecer a única aparição de Dulcina de Moraes em longas metragens e a segura direção do português Chianca de Garcia, um dos diretores artísticos do Cassino da Urca e primeiro diretor artístico da TV Tupi.
Não percam!

Ah, sim: para quem voltou da Lua ontem depois de meio século de residência, vai aí uma breve ficha técnica do filme, extraída do próprio site da Cinédia:


24 HORAS DE SONHO
(Brasil/Rio de Janeiro – 1941)

Direção: Chianca de Garcia
Argumento: Joracy Camargo
Elenco: Dulcina de Moraes, Odilon Azevedo, Conchita de Moraes, Sadi Cabral, Silvino Netto, Paulo Gracindo, Oscarito (como Oscarito Brennier).

Razões (para mim e para outros que se interessam por cinema brasileiro e sua história) para ver este filme:
1- Português de Lisboa, Eduardo Chianca de Garcia (1898 - 1983) não foi apenas cineasta, mas também dramaturgo e jornalista. Já era conhecido em Portugal por filmes como A Aldeia da Roupa Branca (1938). Radicou-se no Brasil a partir de 1940, e estreou no cinema brasileiro dirigindo dois filmes na Cinédia: Pureza (1940) – baseado em romance de José Lins do Rego – e este filme sobre o qual estamos falando.
Também foi roteirista do filme Appassionata (1952), dirigido pelo compatriota Fernando de Barros para a Cia. Vera Cruz. Fora do cinema, dirigiu diversos espetáculos no Casino da Urca do Rio de Janeiro.
2- O filme marcou a única aparição nas telas de Dulcina de Moraes (1908 - 1996), uma das maiores atrizes do teatro brasileiro. Se isso interessa aos bur(r)ocratas de Brasília: em seus últimos anos radicou-se na capital federal, onde criou a Fundação Brasileira de Teatro (FBT), que depois se transformou na Faculdade de Artes Dulcina de Moraes.

No entanto, ninguém viu 24 Horas de Sonho na TV Brasil.
Não, não houve nenhum apagão ou outra desgraça técnica que impedisse a exibição do filme.
Simplesmente ocorreu o que Gustavo Lopes, membro da equipe da Cinédia, nos informa soltando justo fogo pelas ventas:

"Estou frustrado com a TV Brasil. A própria empresa informou diretamente Alice Gonzaga de que o filme "24 Horas de Sonho", o filme mais luxuoso da Cinédia, seria exibido hoje no "Cine Nacional" 22:30. No lugar estão exibindo uma produção de 2010.
Segue reprodução do e-mail enviado por representante da TV Brasil informando, equivocadamente, a exibição da obra na data de hoje. Tal e-mail apenas reitera que a responsabilidade do ocorrido é exclusiva da emissora, e que nós espectadores, e da mesma forma a equipe da Cinédia, fomos todos pegos de surpresa em vista do acontecimento."

A produção de 2010 que foi exibida no lugar de 24 horas de sonho foi Desassossego (Filme das Maravilhas), longa-metragem realizado por dez diretores, acompanhados por Karim Aïnouz (Madame Satã).
Bem, eu conheço bem o Desassossego (Filme das Maravilhas). Diria até que foi um prazer ter revisto este poético filme.
Não fosse um pequeno detalhe, prezados senhores.
Esse detalhe chama-se desrespeito.
Desrespeito à mais antiga produtora de cinema de cinema do Brasil, com 84 anos de vida e um currículo de mais de 50 filmes – entre eles, um dos primeiros (e, ainda hoje, mais encantadores) filmes musicais brasileiro, Alô, alô, Carnaval (1936); uma das maiores bilheterias (até Dona Flor e seus dois maridos, 1976), O Ébrio (1946); e uma obra prima do cinema brasileiro, Ganga Bruta (1933), de Humberto Mauro.
E desrespeito ao público de uma emissora pública, que pode não atingir os 30 ou 40 pontos da Globo, mas que merece respeito.
E, desde já, esclareço que os realizadores de Desassossego (Filme das Maravilhas) não tem nada a ver com isso, com esse desrespeito.
O principal responsável por esse desrespeito, caros senhores, é a emissora de TV que gerenciam – a TV Brasil.
Está bem, está bem, eu sei das dificuldades pelo qual a EBC passa: falta dos recursos da Contribuição para o Fomento da Radiodifusão Pública, que as empresas de telecomunicação ainda depositam em juízo, enquanto tentam contestar a contribuição na justiça; o possível contingenciamento dos recursos do orçamento federal para a EBC; a falta de recursos para a modernização de equipamentos - e eu falo de cadeira, como espectador: não sei como é a qualidade da transmissão da TV Brasil em outros lugares do Brasil; aqui, o principal problema é o som – muito baixo durante os programas – o que me obriga a aumentar o som para ouvir. (Não, não fui ao otorrinolaringologista ainda, pois minha audição vai muito bem, obrigado; entretanto, serei obrigado a consultar um se o som continuar a aumentar abruptamente nos intervalos...)
Mas, sem querer ser chato e já sendo, hão de convir, caros senhores, que falta de recursos financeiros não pode e nem deve ser sinônimo de administração desorganizada. Ou, para ser mais franco: pouco dinheiro não justifica gerir uma TV pública, se me permitem o português claro, na base do bundalelê.
(Aliás, nem pouco dinheiro nem "boa vizinhança" com as redes de TV privadas – isto é, com a grande velha mídia, que, como é público e notório, não vai muito com os cornos do governo da nossa atual presidente.)
Especialmente com estes feios hábitos de mudar a programação na última hora SEM AVISAR A NINGUÉM, e SEM JUSTIFICATIVAS.
Isso só faz com que uma emissora se desmoralize. Isso faz com que a TV Brasil pareça cada vez menos uma emissora pública, e cada vez mais um canal de TV dos anos 1950/1960, gerido na base do improviso.
Em todo o caso, gostaria de sugerir aos senhores que enviem – mesmo que seja em seu site – uma nota, solicitando desculpas à Cinédia (e aos telespectadores) pela falha.
Posso até sugerir algumas justificativas aceitáveis para tal desrespeito. Aí vão:

1- "Infelizmente, houve um problema técnico com a cópia do filme fornecida pela Cinédia" – (Hummm... pensando bem, não é uma boa ideia: se interessa à Cinédia a exibição de seu filme, não mandaria uma cópia incompatível. Aliás, a primeira coisa que a Cinédia faria é consultar a própria TV Brasil para saber quais as condições técnicas da cópia do filme, certo?)

2- "Houve um engano: divulgamos a data de exibição errada." – (Bem plausível – afinal, enganos acontecem – embora deixe no ar a impressão de que a TV Brasil está sendo gerida como a casa da mãe Joana.)

3- "Por problemas técnicos, não pudemos exibir o filme." – (Embora seja bem parecida com a desculpa 1, na verdade há uma diferença: responsabiliza mais diretamente a TV Brasil, não a Cinédia. Até tem uma vantagem: chama a atenção do governo para a necessidade de modernizar os equipamentos, não só da TV Brasil, mas das emissoras da EBC – afinal, a partir de 2016, a TV analógica começa a ser desligada. Já pensou se a TV Brasil continua analógica até lá? Acaba saindo do ar, não é?)

Essas são algumas sugestões de desculpas à Cinédia e ao público da TV Brasil. Sintam-se no direito de descobrir outras.
O que não podem é fazer de conta que não ouviram.
Daí, talvez sejam os senhores que devam consultar um otorrinolaringologista...

Atenciosamente...